Quando eu nasci, meu pai tinha esperanças. Quando eu cresci e tinha cinco anos, ele estava apreensivo. Quando eu me tornei adolescente ele começou a temer pelo pior. Quando eu comecei a trabalhar, antes de terminar o ensino médio, ele ficou aliviado. Pensou que eu seria sempre pobre, mas nunca seria ladrão ou desocupado. Quando eu saí de casa com 19 anos, meu pai teve orgulho e medo ou vice-versa. Torceu muito por mim.
Hoje, passado mais de 30 anos, gosto de pensar que o orgulho venceu o medo e ele está de boa com as escolhas que fez como pai. Agora é minha vez: esperança, apreensão, medo…
Muita coisa foi sorte. Outro tanto, foi a inclinação pela afirmação da vida. Minha e dele. Desejo ser um bom pai e contar com a sorte.
Sei que existem milhões de pais que partilham a sua sina comigo. Os de agora e os do passado, não tiveram a sorte de ser gaúchos e brasileiros entre o século XX e o século XXI. Vivemos a melhor época e o melhor lugar da história da humanidade para sermos pais ou sermos filhos.
O tempo, a intempérie e os predadores não estão mais no topo das estatísticas de fatalidades e é possível confiar como nunca antes. Um tetravô meu há 100 ou 150 anos contou com a sorte para deixar-me um bisavô. Há mil anos, não consigo nem imaginar de que modo um pai e um filho qualquer podem estar inscritos na cadeia de meu DNA. Há 100 mil anos minha perspectiva de vir a nascer e ter um filho, era algo da ordem de uma para centenas de milhões de opções que não viram a luz do sol.
Naqueles tempos – em que éramos as presas de répteis e de mamíferos maiores – 500 em cada 100 mil humanos sofreram uma morte violenta. Hoje, achamos demais algo em torno de 20 ou trinta mortes. Mais de 50 em 100.000 mortes só são possíveis em catástrofes ou guerras. Aprendemos a sentir mais esperança, apreensão e medo. A esperança, a apreensão e o medo de um pai… Mas raramente conhecemos o desespero.
Mas, além de pai, sou Professor e Técnico em Enfermagem. Estou em contato com a curva de baixo da estatística. Conheço o desespero de filhos, muitos filhos. Certamente mais filhos do que pais. Conheço o desespero de filhos que se tornam pais. Em uma sucessão vertiginosa, em que por mais pais que existam, só vejo filhos. Pais que nunca deixam de ser filhos. Por que nunca tiveram pais. Mesmo assim eles reproduzem-se. Só por isso são pais. Eles não têm medo. Nem apreensão. Nem esperança. Só desespero.
As criadoras da humanidade foram mulheres, um passo adiante das fêmeas, que sucederam as progenitoras para se tornar mães.
Peter Sloterdijk defende a teoria de que até a humanização avançar, os primatas, do mesmo modo que os demais animais, especialmente, os mamíferos tinham progenitoras. Nós, seres humanos, somos o efeito do surgimento das mães. Mulheres capazes de dar aos filhos um cuidado para além da mera manutenção das funções vitais.
Mães dão carinho e podem cuidar da fragilidade de recém nascidos, que são prematuros. Isso é único no reino animal, do qual somos parte. Somos os mais dependentes dos animais. Além disso, mães, diferentemente das progenitoras, são capazes de investir afeto amoroso em filhos frágeis. Sem essa capacidade de mimar os mais frágeis, a humanidade não teria emergido do conjunto dos primatas.
Só podemos ser pais porque no lugar de progenitoras, temos e tivemos mães.
Por patrinutri
Ser progenitora e mãe é maravilhoso, porém não sem sofrimentos, dúvidas, desafios. Medo e desejo de fazer um bom cuidado, promover uma boa educação e possibilitar a vida de seres autônomos e fortes nesta luta por sobrevivência e convívio social respeitoso e potente de vida.
Num momento da história em que estes valores estão sendo subvertidos por um falso paradigma de liberdade e religiosidade, estamos cada vez mais desafiados a separar o que joio de trigo e nesta árdua caminhada colocar se atitude de aprendizado e trocas de experiências sem dúvida nos possibilita acertar ainda mais.
Grata por sua reflexão e diálogo.