SUS, direito de todos?

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O texto abaixo é da coluna de Opinião de hoje, do Jornal Estado de Minas.

Vale a pena ler, pois traz breve histórico e desafios do SUS!

 

 

 

No Brasil, cerca de 1000 municípios estão sem médico. Ontem,

comemorou-se o 20º aniversário do Sistema Único de Saúde (

SUS) , que foi concebido pela Constituição de 1988 com a responsabilidade de assegurar aos brasileiros os princípios de

universalidade, igualdade e integralidade. Nestes 20 anos, o

SUS avançou, mas ainda não é o modelo para aqueles que dependem exclusivamente da saúde pública. Os atuais rumos da

estruturação da saúde, definidos pelo sanitarista Nelson Rodrigues

dos Santos, mostram um sistema público deficiente para

75% dos cidadãos. Os 25% que têm condições de pagar pela

saúde suplementar buscam no SUS a complementação da assistência, medicamentos e próteses mais caras. Os recursos

necessários ao funcionamento do SUS não são aplicados em

sua plenitude. Nestes 20 anos, a disposição transitória da

Constituição que previa a destinação de 30% do orçamento da

seguridade social à saúde não teve efeito. Hoje, equivale a

mais de R$ 100 bilhões, e não os R$ 48, 5 bilhões aprovados no

Orçamento federal.

O problema do financiamento continuou. Em 1997, mais da

metade da arrecadação da extinta Contribuição Provisória sobre
Movimentação Financeira ( CPMF) foi desviada. Já em
2000, a Emenda Constitucional 29 foi aprovada sob a condição
de que os percentuais mínimos da União fossem calculados
com base na variação nominal do Produto Interno Bruto ( PIB)
e não sobre a arrecadação da receita corrente bruta, como determinado aos estados e Distrito Federal em 12% e aos municípios 15%. Há cinco anos, lutamos pela regulamentação da
EC 29 para definir o queé gasto e açãoemsaúde e cobrar que estados e municípios invistam efetivamente o percentual definido
pela legislação, porém, a única esperança que resta é acreditar
nos parlamentares que prometeram votar a pauta depois das
eleições.
Ao falar dos 20 anos do SUS, é imprescindível citar o Programa
Saúde da Família ( PSF) , primeira iniciativa visando à construção
de um projeto de atenção básica nacional. Mas o que vemos
em todo o país são prefeituras ávidas por receber a verba
dedicada à saúde da família, instituindo programas com relações
de trabalho precárias, muitas vezes, submetidas a interesses políticos que deixam os profissionais à mercê de interesses
menores. Isso fragiliza a atenção básica e sobrecarrega
outros níveis do sistema, principalmente as urgências de cidades-
pólo e regiões metropolitanas.
A força de trabalho é o principal recurso do SUS. Construímos
um projeto com qualidades, mas deixamos de lado a valorização
de quem o faz funcionar. Não teremos um sistema decente
se não garantirmos condições básicas como acesso ao
serviço público por concurso, plano de carreira e vantagens pessoaisque permitam vislumbrar melhorias ao longo dos anos.
Na ausência dessas premissas, sem tocar na questão salarial, teremos sempre as dificuldades que hoje se apresentam nas
equipes incompletas, rotatividade e dificuldade de fixar o profissional.
Não existe mais a figura do médico que com estetoscópio, aparelho de pressão, e conhecimento resolve muitos dos problemas da população. O mundo e a medicina mudaram e precisamos de condições adequadas para realização do trabalho. Sem exames complementares, referência e contrareferência, educação continuada e acesso à internação e consultas especializadas, instala-se a frustração profissional e não existe salário que fixe médicosem determinados locais. No Brasil, cerca de 1 mil municípios estão sem médico, mas certamente nessas cidades não faltam juízes, promotores e delegados,porque eles têm perspectiva de carreira e salário digno.
A municipalização da saúde foi um ganho, mas acredito que temos
de definir uma carreira de Estado nacional. Estados e
União não podem se furtar a regulamentar as condições em que
os profissionais vão se relacionar com seus gestores diretos. O
médico só vai ficar no serviço público de algumas cidades se tiver
perspectiva de transferência para centros maiores ao longo
da carreira, sendo substituído por outro profissional que passará
pelo mesmo processo. Afinal, a obrigação constitucional de
prover justiça é mais importante que o dever de prover saúde?
Os salários influenciam, mas a carreira é o que fixa o profissional.
A meu ver, esse é o grande desafio do SUS.