Manifesto CEBES: a definição das políticas de saúde não compete ao STF

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 Preocupado com a quantidade de pessoas que, individualmente, procuram a via judicial para garantir seu direito à saúde e com a diversidade de sentenças sobre assuntos correlatos, o STF convocou uma Audiência Pública para debater o tema com representações dos poderes do Estado e da sociedade civil organizada.
  
A competência precípua do Supremo Tribunal Federal é a guarda da Constituição. Por sua vez, as políticas estruturantes na área da Saúde estão definidas constitucionalmente. O SUS é fruto do protagonismo político da sociedade brasileira, consolidado no plano normativo, inicialmente pelo poder constituinte, e, em seus desdobramentos, por legislações infraconstitucionais. Cumpre ao Supremo a tarefa de garantir a efetividade das normas constitucionais que regem o SUS.

A pauta escolhida pelo STF para a referida audiência, conforme se depreende do ato convocatório, resulta da casuística dos Tribunais, existente nos processos dos que efetivamente recorreram ao Judiciário para a garantia de seus direitos, individualmente considerados. A pauta da audiência – em si – causa perplexidade, especialmente porque as demandas contempladas pelo Judiciário resultam de conflitos de natureza interindividuais, quando o texto constitucional aponta para um direito coletivo. Ou seja, aponta para a garantia de direitos para toda a população, e tendo como pressuposto a integração com os dois outros componentes da seguridade social, previdência e assistência; no caso da saúde, o cumprimento pleno desse direito é dependente da construção do Sistema Único de Saúde (SUS). Para que um dia se concretize o desejo da sociedade brasileira de que a saúde seja um direito de todos, é necessário o envolvimento de todos os entes da federação, assim como de toda a sociedade.

A efetividade de uma política como a da construção do SUS, numa sociedade complexa, portanto, exige atuação mais desprendida da tripartição original dos poderes da República, voltando-se para uma ação de maior harmonia. Mais ainda, o artigo 194 da CF determina claramente que esta garantia deve se assegurada mediante políticas públicas – sociais e econômicas, que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Ainda que reconhecendo a importância de responder as perguntas selecionadas pelo STF, não se pode deixar de chamar a atenção para o fato de que, por mais abrangente e acurado que seja o conjunto de respostas dadas a tais perguntas, tais respostas, sendo dependentes do modo como as perguntas formuladas, jamais darão conta de tornar efetivo o mandato constitucional referente à saúde. A lógica utilizada pelos advogados defensores de cada impetrante que inicia as ações judiciais obedece exclusivamente à defesa dos interesses pessoais ou individuais dos impetrantes de tais ações. Jamais leva em conta conceitos como universalidade, integralidade, continuidade ou equidade, de importância estratégica e estruturante para o SUS e reconhecidos pela Constituição Brasileira. Exatamente a Constituição que compete ao STF defender e fazer concretizar.

As questões de relevância, com força estruturante para o SUS, afloram na tutela do Direito Sanitário, coletivamente considerado, e não integram os processos dos que pleiteiam a efetividade de direitos individuais. Mais ainda, a soma dos direitos individuais não resulta na efetivação do direito coletivo à saúde, que o constituinte se propôs a garantir a toda a população brasileira.

 

 

Leia aqui este e outros documentos propostos pelo CEBES como subsídios para o debate sobre o SUS convocado pelo STF.