Uma Reflexão sobre a Internação Compulsória

13 votos
Robson Mendes 01/10/2014

Drogas como o crack agem de maneira tão agressiva no corpo do usuário que não permitem que ele entenda a gravidade de sua situação e o quanto seu comportamento pode ser nocivo para ele mesmo e para os outros. Foi com base nessa ideia que foi apresentado uma proposta de política pública que prevê a internação compulsória temporária de dependentes químicos segundo indicação médica após o paciente passar por avaliação com profissionais da saúde. A internação contra a vontade do paciente está prevista no Código Civil desde 2001, pela Lei da Reforma Psiquiátrica 10.216, mas a novidade agora é que o procedimento seja adotado não caso a caso, mas como uma política de saúde pública – o que trás a polêmica: ser a favor ou contra a internação compulsória?

Acho que devemos levar em conta cada situação, pois existem casos graves em que todo os tratamentos já foram realizados, mas sem ter bons resultados, existem casos também que  o sujeito precisa de uma internação para se intoxicar, precisa de acompanhamentos 24h, pois as recaídas fazem parte deste quadro. Cabe aos familiares que carregam todo o sofrimento decidir o que fazer, pois os usuários não têm nem mesmo condições de decidir o que querem nesta difícil fase na qual se encontram.

Devemos considerar também a idéia de um atendimento multiprofissional, das muitas formas possíveis de tratamento, como a redução de danos, consultórios de rua, atendimentos oferecidos nos CAPS etc. devemos olhar o individuo de forma diferenciada, de acordo com seu contexto de vida, com suas vivências, e não apenas como portadores de uma patologia. Devemos viver em sociedade, devemos tratar em sociedade. Isolar as pessoas em um manicômio nem sempre pode ser a melhor forma de tratamento.
 

Post relacionado a: Santa Maria, RS

3 Comentários

Faça login para comentar e recomendar este post a outros usuários da rede.

Por Marcelo Dias

Concordo contigo,  "Isolar as pessoas em um manicômio nem sempre pode ser a melhor forma de tratamento".

Acho que não foi à toa que você disse: " existem casos também que  o sujeito precisa de uma internação para SE INTOXICAR,,,"

 

Abraço, Marcelo.

Por Raphael

Quando você fala que cabe aos familiares decidir, lembre-se muitas pessoas são internadas porque a família prefere transferir a outros a responsabilidade de cuidar, e exitem casos ainda piores onde a internação ocorre para que os familiares gerenciem o $$$ e os bens de seu ente "querido".

Acredito que esse procedimento deve ser adotado caso a caso como prevê a Reforma Psiquiátrica Brasileira e você mesmo reforça esse posicionamento quando afirma que:

"Devemos considerar também a ideia de um atendimento multiprofissional, das muitas formas possíveis de tratamento, como a redução de danos, consultórios de rua, atendimentos oferecidos nos CAPS etc. devemos olhar o individuo de forma diferenciada, de acordo com seu contexto de vida, com suas vivências, e não apenas como portadores de uma patologia. Devemos viver em sociedade, devemos tratar em sociedade".

Eu acredito que isolar as pessoas em um manicômio é uma prática tão cruel sem qualquer justificativa, pois em nome da razão quantas formas de exclusão e sofrimento temos produzido?

Abraço

Raphael

Por deboraligieri

Caro Robson.

Isolamento quase nunca é a solução de qualquer problema, como vemos pelas cadeias brasileiras. Assim como a internação irrestrita, o aprisionamento indistinto fere o direito à subjetividade da pessoa e à sua dignidade humana. Na seara psiquiátrica, o Estado interna as pessoas com problemas de saúde que não consegue lidar, na seara penal, o Estado interna as pessoas que representam os problemas de inclusão social do próprio Estado. A linda reflexão do Raphael é uma oportunidade de desenvolvimento da matéria com enfoque na humanização, propiciando ainda um exercício de cidadania responsável ao fazer pensar na pergunta: quantas formas de exclusão temos produzido em nome da razão (e eu completaria – sem olhar nos olhos os excluídos)?

Apenas a título de esclarecimento (sou advogada, além de usuária do SUS, então fique à vontade para me consultar sobre leis de saúde), a internação compulsória que você menciona não é mais a mesma, pois um novo Código Civil foi promulgado em 2002 revogando o anterior. O que hoje temos de internação compulsória no Código Civil serve apenas para pessoas judicialmente interditadas, ou seja, não é para qualquer pessoa com problemas com drogas. E mesmo as interditadas, o artigo 1777 do CC menciona que elas serão "recolhidas" (que termo horrível, pessoas não são entulhos pra se recolher!) em manicômios quando não se adaptarem (conforme o entendimento de quem?) ao convívio familiar. Há leis esparsas, fora do atual Código Civil, prevendo outras hipóteses de internação compulsória, grande parte delas questionada por sua inconstitucionalidade (todos tem direito à vida, e internação é tudo menos vida para o paciente, é a interrupção da vida na verdade).

Um grande abraço,

Débora