Novembro azul: diabetes, democracia e participação social

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14 de novembro é o Dia Mundial do Diabetes, data oficialmente reconhecida pelo Ministério da Saúde no Brasil (1). Durante o mês inteiro (chamado de Novembro Azul em razão da cor símbolo da campanha), associações de pacientes, militantes e entidades médicas promovem ações de conscientização sobre os riscos do diabetes mal tratado ou diagnosticado tardiamente (nos casos de tipo 2).

Apesar do Novembro Azul existir desde 1991 (2), e desde 2006 ser reconhecida a data pelas Nacões Unidas através da Resolução nº 61/225 (3), até 2012 eu não conhecia essas ações, em razão do ainda precário compartilhamento de conteúdos e eventos em redes sociais, e também por não ter me descoberto até então como ciberativista, o que só aflorou após o anúncio do projeto de retorno da fabricação da insulina NPH pelo Brasil (4).

Quando tomei conhecimento do Novembro Azul em 2013, chamou minha atenção o enorme envolvimento na campanha de empresas farmacêuticas e de indústrias de alimentos, que comercializam produtos para pessoas com diabetes. Me parecia que, tratando-se de uma questão de saúde pública – já que o diabetes atinge 14 milhões de pessoas no Brasil (considerando apenas os portadores da doença, que na verdade afeta toda a família da pessoa), ou 7,4% da população brasileira (5), o principal envolvido nas ações de conscientização deveria ser o Poder Público.

Pensando nisso, e verificando que o Ministério da Saúde não tinha qualquer ação programada para o Novembro Azul, eu e o grupo Blogueiros de Diabetes promovemos a ação "Na ponta do dedo, o sangue pelo Brasil" (6), um tuitaço para que o então Ministro da Saúde Alexandre Padilha, se colocando no lugar de cada pessoa com diabetes, fizesse o teste de glicemia no Dia Mundial do Diabetes. E nosso pedido foi atendido por Padilha!

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De 2013 para cá, meu entendimento sobre a relação do Poder Público com as ações do Novembro Azul, no que se refere ao envolvimento dos gestores do SUS com a educação e prevenção da doença como atores principais dessas ações, sofreu algumas alterações.

Embora não haja nenhuma ação específica do SUS para o Novembro Azul, durante todos os meses do ano o Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de saúde promovem ações voltadas ao tratamento e prevenção do diabetes. Estes são apenas alguns exemplos:

– o programa de assistência farmacêutica do SUS, embora tenha problemas com o fornecimento errático de insumos e medicamentos, atende 8.692.853 pessoas com diabetes pela farmácia popular, segundo dados do Conselho Nacional de Saúde (7);

– orientações sobre alimentação equilibrada como forma de promoção da saúde, um dos fatores de prevenção do diabetes tipo 2, são encontradas no guia alimentar para a população brasileira do Ministério da Saúde (8);

– orientações para profissionais que cuidam de pessoas com diabetes são encontradas em materiais específicos, destinados aos trabalhadores da saúde, como o caderno nº 36 da atenção básica (9);

– exercícios físicos, que contribuem tanto para o bom controle da glicemia de quem já tem diabetes como para prevenir o aparecimento da doença, podem ser realizados em aparelhos de ginástica disponíveis em várias praças na cidade de São Paulo, que tem ainda 3 parques com academias gratuitas a céu aberto (10);

– o apoio na promoção do autocuidado, que tem importante papel na melhoria da qualidade de vida da pessoa com diabetes, pode ser aperfeiçoado através de 3 cursos disponíveis gratuitamente na Comunidade de Práticas do Ministério da Saúde (11).

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Percebi também que, a partir da ideia de que vivemos num Estado Democrático de Direitos, onde o poder emana do povo, que não o exerce apenas através de representantes eleitos, mas também diretamente (artigo 1º, § único, da Constituição Federal), o principal ator do Novembro Azul não é o Poder Público, mas a sociedade brasileira. Cabe a todos nós, cidadãos e cidadãs, buscar junto ao Estado as orientações referentes à conscientização e prevenção da doença, bem como a ampliação da assistência e dos direitos das pessoas com diabetes.

Em 2014, durante a consulta pública para a incorporação de análogos de insulina ao SUS promovida pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do Ministério da Saúde – CONITEC, criei um evento no facebook através do blog Diabetes e Democracia para a coleta de depoimentos de pacientes com diabetes que se beneficiaram com o tratamento com essas insulinas. Esses depoimentos foram tuitados ao Ministério da Saúde desde então, como forma de mostrar as pessoas substituídas pelas evidências científicas nesses estudos de incorporação de medicamentos. Para mostrar que somos de carne, osso e sangue (com açúcar!).

Neste novembro azul de 2015, pensando em comemorar a data através da participação social das pessoas com diabetes no SUS, e já que a incorporação não foi aprovada (ainda) pela CONITEC, reativei a página do evento "Somos mais de um milhão de motivos para a incorporação dos análogos de insulina ao SUS" para coleta de relatos sobre os benefícios dos análogos de insulina (principalmente as ultrarrápidas aspart/novorapid, lispro/humalog e glulisina/apidra) na vida prática de cada pessoa com diabetes tipo 1, em apoio ao fornecimento desses medicamentos pelo SUS. Mais de um milhão porque apenas 8% dos casos de diabetes correspondem ao tipo 1, segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes.

O evento está neste link: https://www.facebook.com/events/729147213785889/. Convido todas as pessoas a participarem e compartilharem seu depoimento em prol da incorporação dos análogos de insulina ao SUS, seja como pessoa com diabetes, seja como pessoa que convive com alguém com diabetes, ou que simplesmente apoia nossa luta.

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A campanha, que em 2014 defendia a incorporação irrestrita – de todos os análogos de insulina, para todas as pessoas com diabetes – foi adaptada para se unir à luta que a Sociedade Brasileira de Diabetes e outras associações médicas e de pacientes vem fazendo para direcionar o pedido para a faixa etária prioritária (jovens e crianças), para o tipo de diabetes que não se adapta ao tratamento tradicional (tipo 1), e para as insulinas que representam menor impacto orçamentário para o SUS, com evidências de sua eficácia na melhoria do tratamento (ultrarrápidas). Há inclusive uma petição pública na avaaz defendendo a incorporação dos análogos de insulina utrarrápida para jovens e crianças, que pode ser assinada através deste link: https://secure.avaaz.org/po/petition/Exmo_Sr_Ministro_da_Saude_do_Brasil_Professor_Doutor_Arthur_Chioro_Disponibilize_insulinas_melhores_para_criancas_e_adol/?nLDoBib

Há ainda duas iniciativas que valem ser mencionadas como possibilidades de participação social das pessoas com diabetes na produção de saúde, ambas da Rede HumanizaSUS.

Na campanha de combate à dengue (12), destinada à troca de experiências para criar um acervo de estratégias utilizadas nessa luta, a pessoa com diabetes pode relatar se passou por um tratamento bem sucedido, como conseguiu controlar a glicemia apesar dos sintomas da dengue (com vômitos e diarréias, que costumam acarretar queda e elevação bruscas da glicemia), se avisou o profissional que tomava aas (muitos pacientes usam a medicação), ou até mesmo se gostaria que alguma medida fosse implementada nos serviços públicos que passou para cuidar da saúde na ocasião. Esse é um tipo de experiência que pode ajudar tanto outras pessoas com diabetes, caso venham a ter dengue, quanto os profissionais de saúde, que podem atender um paciente com dengue e diabetes.

E na campanha da 15ª Conferência Nacional de Saúde (13), destinada ao debate de propostas para a melhoria da saúde pública de qualidade enquanto direito do povo brasileiro, as pessoas com diabetes podem relatar os problemas que tem para acessar seus direitos – aos medicamentos e insumos, aos exames laboratoriais, ao atendimento por especialista da área de endocrinologia – e propor soluções para que o SUS corresponda às necessidades diferenciadas de cada paciente. Se tiver participado de conferências regionais e/ou for participar da conferência nacional como delegado, é possível relatar se o diabetes foi abordado nos debates, se houve alguma deliberação a respeito, ou simplesmente como ocorreu essa experiência.

Todas as propostas narradas são apenas alguns exemplos de iniciativas que valorizam a participação social no SUS. Há incontáveis outras com possibilidade de favorecer as pessoas com diabetes de forma coletiva, que podem inclusive ser sugeridas para menção posterior através de comentários ao post.

Se o poder emana do povo, vamos exercê-lo, neste novembro azul e nos demais meses do ano!

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Observação 1: agradeço às amigas Patrícia Silva e Mariana Oliveira pela indicação de conteúdos que me ajudaram a escrever o texto.

Observação 2: após a publicação desse texto, mais duas iniciativas de apoio público ao cuidado das pessoas com diabetes foram indicadas.

A primeira veio através do periódico do Telessaúde da UERJ, que desenvolveu um site temático dentro do projeto Telessaúde na Escola, voltado para crianças e adolescentes, e que explica de forma didática o que é diabetes, seus sintomas, tratamento e prevenção. Para ter acesso ao site, basta clicar neste link: https://www.telessaude.uerj.br/diabetes/

A segunda veio através de indicação de Mariella Silva de Oliveira Costa no facebook, a respeito da nova área no portal da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que aborda o diabetes. Para ter acesso à área da Fiocruz sobre diabetes, basta clicar nesse link: https://portal.fiocruz.br/pt-br/diabetes

Referências:

(1) Calendário da Saúde: https://portalsaude.saude.gov.br/index.php/cidadao/comunicacao/leia-mais-comunicacao/136-chamada-eventos

(2) Dia Internacional do Diabetes – Federação Internacional do Diabetes: https://www.idf.org/WDD15-guide/

(3) Resolução nº 61/225 das Nações Unidas (ONU): https://www.idf.org/sites/default/files/UN%20Resolution%20on%20World%20Diabetes%20Day%20of%20Dec%202006.pdf

(4) Texto de 2013 "Sobre carroças e diabéticos brasileiros, ou a insulina brasileiro-ucraniana", que debate o assunto: redehumanizasus.net/67179-sobre-carrocas-e-diabeticos-brasileiros-ou-a-insulina-brasileiro-ucraniana

(5) Notícia do site Portal Brasil "Número de pessoas com diabetes aumenta 40% em seis anos": https://www.brasil.gov.br/saude/2013/11/numero-de-pessoas-com-diabetes-aumenta-40-em-seis-anos

(6) Texto base da campanha "Na ponta do dedo, o sangue pelo Brasil": https://redehumanizasus.net/67087-na-ponta-do-dedo-o-sangue-pelo-brasil

(7) Cartaz divulgado pela fanpage da 15ª Conferência Nacional de Saúde: https://www.facebook.com/conferenciasaude15/photos/a.1578735679054688.1073741828.1575110316083891/1635170483411207/?type=3&theater

(8) Guia alimentar para a população brasileira (em pdf): https://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/novembro/05/Guia-Alimentar-para-a-pop-brasiliera-Miolo-PDF-Internet.pdf

(9) BRASIL. Ministério da Saúde. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: diabetes mellitus. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. (Cadernos de Atenção Básica, n. 36): https://dab.saude.gov.br/portaldab/biblioteca.php?conteudo=publicacoes/cab36

(10) Academias a céu aberto unem boa forma física, saúde e natureza: https://www.cidadedesaopaulo.com/sp/br/esportes/2861-academias-ao-ar-livre

(11) Link para os cursos de "Autocuidado – como apoiar a pessoa com diabetes" de nível médio, superior, e para agentes de saúde: https://cursos.atencaobasica.org.br/courses

(12) Link da campanha de combate à dengue da Rede HumanizaSUS: https://redehumanizasus.net/taxonomy/term/16965

(13) Link da campanha da 15ª Conferência Nacional de Saúde: https://redehumanizasus.net/15conferenciahttps://redehumanizasus.net/15conferencia