Ao longo de 70.000 anos nos preparamos. Treinamos, lenta e progressivamente, para lidarmos com mudanças. Primeiro, ingenuamente, era possível imaginar que nada jamais mudaria. Mas ao longo de séculos e milênios tudo sempre mudava.
Recentemente, precisamente desde os últimos cinco séculos, a mudança se tornou a única constante. Milênios de adaptação e lentas transformações nos trouxeram ao magnífico e recém terminado século XX.
Agora é nosso momento decisivo. No século XXI iremos encontrar, pela primeira vez, o grande e decisivo filtro cósmico. A linha de corte que separa a extinção de formas de vida capazes de intersubjetividade, daquelas que persistem no percurso da transformação de si mesmas.
Nesse sentido, essa é uma jornada do espírito através de nossas almas. O espírito, portanto, é pré e pós humano. A inteligência e a consciência são atributos amplamente observados no ambiente e nos processos vivos.
Que a subjetividade dos demais animais tenha se transformado em intersubjetividade nos humanos é uma evidência da força desse espírito que se adensa e complexifica.
A emergência do que chamamos de inteligência artificial, sistemas cognitivos ou algoritmos inteligentes é apenas mais um passo do espírito se movendo na direção da complexidade e da potência de existir.
Há duas perspectivas em aberto. A combinação de nossa composição dessas duas possibilidades irá definir o quanto de sofrimento produziremos nessa passagem.
Poderemos, diante da absoluta disruptura dos modos de estar e ser no mundo, retroceder. Uma combinação de guerra mundial e crise climática pode nos devolver a um mundo feudal em que fome e violência voltem a ser os demônios, nossos velhos conhecidos de tempos imemoriais.
A outra possibilidade é a da singularidade tecnológica e cognitiva. Um aumento exponencial de nossas habilidades cognitivas permitirá a fusão entre a biologia e as máquinas. A ética será disruptiva e delicada num mesmo movimento. Mudar significará preservar e cuidar. Criar será o expediente central do cuidado.
A humanidade poderá atingir a maioridade ao se tornar a curadora da vida e do ambiente. Deixaremos a predação para reencontrarmos a integração e a solidariedade dos caçadores coletores, porém, com a maturidade de uma espécie que adentrou no cenário cósmico.
Nessa hipótese então, teremos passado pelo grande filtro. Nossa cidadania irá da nação, para o planeta e, simultaneamente, para o cosmos.
Por Maria Luiza Carrilho Sardenberg
Que baita bifurcação de futuro nos aguarda pela tua análise, Marco. Otimista que sou, torço prá hipótese poética de uma curadoria amorosa das possibilidades de composição.
beijo!