A obviedade do sentido da vida e o mistério do sentido da existência. Ou porque o capitalismo é uma forma religiosa:
O sentido da vida é ela mesma. Como isso inclui a morte, a consciência humana ressente-se. Assim, o dinheiro e a mercadoria passam a ocupar o vasto lugar das nossas dúvidas e incertezas com uma resposta falsa.
O óbvio é recusado como reação ao fato de que a existência só pode ser sustentada durante uma fração do tempo. Sem a morte dos organismos, a vida como fenômeno das espécies não poderia se complexificar. A mente não existiria na forma como a experimentamos.
Renunciamos, então, à realidade e criamos muitas ideologias e deixamos que elas governem nossos modos de vida.
O maior dos capitalistas, do mesmo modo que o mais comum dos pobres, vive como se dinheiro e mercadoria tivessem mais do que o seu valor de uso. Assim, são controlados por uma ilusão, dado que confundem o sentido da vida com o sentido da existência.
O sentido da vida é evidente por si mesmo. O sentido da existência permanece além da consciência, porque a consciência é um capítulo da vida. Não podemos, portanto, explicar a vida apenas com uma de suas manifestações.
Podemos acreditar nos sentidos que inventamos. Mas isso não pode, por si mesmo, mudar nada além do universo próprio das consciências. De fato a mente se constitui num universo no interior da realidade. Mas no interior e não sobre ou além da realidade.
A vastidão incomensurável das ideias não é maior do que a vastidão da realidade. O real é o lar onde é possível que habitem incontáveis formas de consciência. Onde é evidente, pelo menos, que está em seu interior toda a imensa riqueza das ideologias nas quais cremos: a realidade contém o local circunscrito da nossa mente e não o contrário.
O capitalismo é a forma de vida que emergiu da variedade de credos inventados pelos seres humanos para dar sentido à existência. Porém, a ideologia do capital faz isso usurpando o sentido da vida. O sentido da vida é o de lidar com ela mesma, com suas exigências e vínculos, no contexto específico de cada espécie.
A vida é um jogo com regras claras e dadas, em vasta medida, a priori. Porém ela também se abre para o inusitado através da combinação de suas interações com o universo em seu entorno e do qual ela é uma parte.
Usar a vida, portanto, para tentar criar um simulacro de sentido para o mistério da existência consiste na iniquidade fundamental do capitalismo.
O que é a vida no capitalismo se não a redução dela mesma aos valores e desígnios da mercadoria e da moeda, do capital, em última instância?
Isso não significa que todos nós vivamos segundo os valores do capitalismo. Isso seria inviável e absurdo. Nós passamos grande parte do nosso tempo em estados de sinergia, colaboração e solidariedade. Se não fosse assim, já estaríamos extintos. O problema das crenças não é o modo objetivo como vivemos. A questão é o sentido que as crenças nos levam a dar para os modos de vida que constituímos.
É nesse ponto que o dinheiro e as mercadorias, que devem servir à vida como ferramentas, passam a submeter a vida. Assim é que a miséria, humanamente construída, passa a reger nosso modo de vida no capitalismo.
Por flaviane vieira dos santos vieira
adorei o post, visto que estudo psicologia e nesse período estamos falando sobre o existencialismo, com kierkegaard e Sartre.