A liberdade, o livre arbítrio, autonomia – todos esses conceitos que destacam seres, ideias e objetos (obviamente causados e nesse sentido, tão determinados quanto inocentes), de sua teia de encontros, relações e desdobramentos, para lhes conferir um status divino (em que culpa, santidade e perdão ao lado de dominação, sujeição e submissão fazem sentido) parecem, de fato, constituírem um real simulado. Um mundo lateral ao real. O mundo imaginando em que caímos voluntariamente.
Mas, paradoxalmente, ao abandonarmos nossa realidade, na queda para o ideal e para o incontornável virtual, fazemos acontecer, damos status corpóreo ao mundo em que vivemos. Ao aceitar a ilusão como a natureza ou “essência” do mundo, fazemos a existência. É nesse sentido que vivemos no mundo que aceitamos merecer. No mundo que queremos.
Estado, livre iniciativa, socialismo, comunismo, capitalismo, anarco capitalismo, anarquismo, república, monarquia, ditadura são articulações dos modos de ser individuais e coletivos. Expressam o desenvolvimento de nossa espécie numa busca incessante por realizar desejos e responder ao prazer e a angústia de existir.
Portanto, se existe alguma coisa que possa ser escolhida é o que podemos fazer em relação ao caos em que existência nos joga.
Assim de modo preciso, vivemos no mundo que temos sido capazes de fazer existir.
A pergunta de se podemos fazer algo melhor dele fica muito bem situada na dúvida. Sem a dúvida jamais teríamos agido no mundo. Teríamos permanecido inertes em relação ao bioma se a inquietação diante da dúvida e da incerteza não nos tivesse projetado, simultaneamente para fora e para os abismos insondáveis da mente.
A incerteza é a condição para desejarmos um mundo melhor e, só então, torná-lo o mundo em que vivemos.