Matéria do Jornal Estado de Minas: 20 anos de SUS e a Mostra HumanizaSUS na Rodoviária de BH

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o SUS continua na mídia!! Vejam aí, a Mostra disparando novos debates e visões sobre o SUS! Ana Rita
Jornal Estado de Minas
TERÇA, 16/09/2008
SUS do choro e raros sorrisos
Sistema que faz 20 anos em outubro avançou em algumas áreas, mas em outras, até em menos complexas, deixa muito a desejar, para desespero de pacientes de baixa renda
Luciana Melo
Bianca Melo

Jair Amaral/EM/D.A Press
Wanderley Cássio Tancredo deu sorte e comemora, no Hospital das Clínicas, o
As doenças se acumulam nesta época do ano em que o ar seco e as variações da temperatura castigam o sistema respiratório de crianças e idosos. Mulheres grávidas precisam de acompanhamento durante a gestação, mas o Centro de Saúde Alvorada, em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, está vazio e os funcionários, parados, cumprem o horário sem maiores tarefas. A calmaria da unidade reflete o abandono em que vive a população: no plantão da tarde não há médico. Para se consultar, é preciso dormir na fila e esperar o dia em que haverá um profissional para atender a demanda da comunidade. A ambulância é o serviço mais solicitado e, quase sempre, é a única saída para não morrer à míngua.

Distante dessa realidade, o auxiliar de serviços gerais Wanderley Cássio Tancredo, de 48 anos, que também é morador da Grande BH, foi mais feliz na busca pelos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). Ele ganhou vida nova depois de um transplante bem-sucedido de fígado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC/UFMG), única unidade de saúde em Minas credenciada a fazer o procedimento. Sofrendo de deficiência hepática desde 1995, há um ano e meio um médico deu a ele uma notícia que o assustou: seria preciso trocar o fígado. Com o salário mínimo que ganha, não havia como fazer muito por conta própria, mas há cerca de um mês ele ocupa um quarto do 9º andar do HC/UFMG. Em um SUS que não conhecia, os exames “naquelas máquinas que a gente entra dentro” foram feitos de graça, e, da mesma forma, ele não pagou nada pelos medicamentos pós-cirurgia. “Estou sendo muito bem tratado”, resume sua felicidade com o fígado novo.

Esses exemplos mostram realidades antagônicas do universo da saúde pública no país. O mesmo SUS que salva vidas sacrifica doentes, com a demora e a dificuldade de acesso a bons serviços. Criado em 1988, o sistema completa 20 anos no próximo mês, com boas e más histórias para contar. A mostra “Humaniza SUS: o SUS que dá certo” foi aberta ontem na rodoviária de BH para apresentar relatos bem-sucedidos de tratamentos administrados pela rede pública. Nas quatro estruturas onde estão expostas as informações, o visitante conhece a história do sistema, as portas de entrada para atendimento, situações consideradas positivas, por meio de monitores com internet, ou telões, textos e fotos. O cidadão pode aproveitar para reclamar do atendimento na ouvidoria, um canal direto com o Ministério da Saúde, que pode ser usado até o dia 26.

Paulo Filgueiras/EM/D.A Press

A coordenadora da exposição e consultora da Política de Humanização do Ministério da Saúde, Edna Moura, sabe que o SUS precisa melhorar e não é pouco. “A mostra é para divulgar o sistema e as coisas positivas, mas conhecemos o tamanho das dificuldades, porque são realidades muito diferentes no país e há problemas de gestão.” Segundo ela, uma questão mais importante a ser trabalhda no sistema, talvez maior do que a eterna briga por mais recurso, seja a melhoria na gestão. “Faltam coordenação e diálogo entre hospitais e postos de saúde. As soluções, às vezes, podem ser muito simples, mas significativas.”

CONTRADIÇÕES Programas de êxito nas áreas da Aids, transplantes e imunização conferiram excelência à rede pública de saúde brasileira e servem como exemplo no exterior. Por outro lado, não é difícil flagrar situações degradantes que mostram a necessidade de o atendimento à saúde pública avançar. Apesar de a prevenção ser palavra de ordem para evitar doenças e combater casos graves, a grávida Cristiane Aparecida de Jesus, de 28 anos, esperou por atendimento em um centro de saúde em Sabará, mas voltou para casa sem saber quando poderá começar a fazer o pré-natal.

Ela foi orientada na unidade a pagar pelo teste de gravidez, se quiser agilidade, e somente depois que tiver a comprovação ambulatorial sobre a gestação poderá ser avaliada pela enfermeira e esperar a consulta com o ginecologista. “Para consultar aqui é preciso dormir na fila, pois são distribuídas poucas fichas. Pela demora, acho que vou começar o pré-natal só depois do quarto mês. Quando estiver na véspera de ganhar o bebê, vou arrumar um comprovante de endereço em BH para ser atendida em uma maternidade de lá, porque aqui é tudo muito precário”, diz. A Secretaria Municipal de Saúde de Sabará foi procurada, mas não retornou ao Estado de Minas.