A Construção dos Colegiados de Gestão Regional da Saúde do Estado do Rio Grande do Norte: mais um passo à frente
Os dias 23 e 24 de abril certamente ficarão na história da construção do SUS do Rio Grande do Norte, assim como na memória dos que participaram do I Seminário de gestão Regional realizado em Natal e II Seminário de Educação Permanente. Esse seminário ficará como um marco no processo de construção dos Colegiados de Gestão Regional (CGR) de saúde no estado. Realizado numa conjuntura difícil, isto é, de profunda crise no setor de saúde do RN, inclusive já conhecida em nível nacional, tanto por sua gravidade quanto pela duração. A realização desse evento se deveu fundamentalmente à SESAP, ao compromisso assumido pelo secretário George Antunes, ao engajamento aguerrido dos trabalhadores e trabalhadoras do SUS e ao apoio efetivo dos diversos parceiros da SESAP/RN, todos, enfim, decididamente empenhados em seguir em frente na construção de uma proposta tão ousada como é a descentralização do poder de
decisões. Durante o seminário, fiquei perguntando a mim mesma como estava sendo possível. Queria entender como, num contexto com tantas dificuldades estávamos todos, trabalhadores, gestores e usuários, dispostos a enfrentar o desafio das complexas questões que serão postas ao longo desse processo.
Com a participação da quase totalidade dos 167 municípios, o Seminário de regionalização do RN foi aberto com cerca de 454 participantes: Coordenadores e sub-coordenadores da SESAP; diretores e técnicos das Regionais de Saúde (URSAPS); prefeitos, membros da Comissão de Integração Ensino-Serviço (CIES) Estadual; facilitadores, articuladores e apoiadores da PNH; Nesc/UFRN, Ministério da Saúde, Conselho Estadual de Saúde, Ministério Público do estado e COSEMS.
Às 8h do dia 23 de abril, os trabalhadores do SUS/RN, o Núcleo Articulador da PNH no estado, representado por Acácia e Geni, gestores municipais e professores da UFRN, juntavam-se em pequenas rodas no saguão do Hotel Praia Mar, conversando, trocando idéias, celebrando, com muita razão, um momento que, mesmo antes da sua abertura, já alegrava a todos. Quem havia chegado logo cedo e estava à espera do “.grande evento”, perguntava com ansiedade pelos convidados do Ministério da Saúde, pelos Conselhos de Saúde que ainda estavam a caminho, pelos colegas do NESC. Perguntava-se isso porque o desejo e a ansiedade exigiam a presença de todos desde as primeiras horas da manhã.
O auditório do hotel com assento para 500 pessoas, como era de se esperar, ainda estava vazio às 8h, mas, pouco a pouco, começou a ganhar vida e cor e não demorou muito para que estivesse cheio de “pessoas de atitudes”, como diria nosso querido Eduardo Passos. Estávamos lá os companheiros defensores do público, aqueles que não vacilam, não por radicalismo infantil, mas porque são aguerridos defensores do bem público, do que é de todos.
O evento teve inicio com uma mesa composta pelo Secretário da Saúde, pelos representantes do Ministério da Saúde vinculados à PNH, DARAS e EP, pelos representantes do Conselho Estadual de Saúde, do COSEMS e da UFRN. Todos os discursos reafirmaram os compromissos políticos e éticos com a construção dos colegiados de gestão e com o SUS. Em seguida, uma mesa-redonda abordou o tema da regionalização no Brasil. Essa contou com a participação do diretor daDARAS (diretoria de articulação de redes de atenção), Adail Rollo, que falou sobre o pacto pela saúde, a regionalização e as redes de atenção à saúde; com o coordenador da PNH, Dário Pasche, falando sobre a Política Nacional de Humanização, enfatizando a importância de se compreender a dinâmica do micro ao macro e do macro ao micro, na implementação das nossas ações, convidando-nos a refletir sobre o humano, a ética, a política, o encontro singular e a construção coletiva; com a representante da Educação Permanente do MS, cujo foco da exposição foi a importância da EP para a condução de todo esse processo; e, por fim, com o representando da UFRN, o companheiro de todos os momentos, Cipriano Vasconcelos, falando sobre o processo de construção da regionalização no RN.
O seminário foi enfático ao discutir as questões locais como o plano diretor de regionalização, os colegiados gestores e EP. A formação dos grupos para as discussões temáticas considerou o novo desenho, ou seja, a composição das oito Regionais. Os trabalhos em grupo, tiveram grande importância por assegurar a ampla participação e debate na elaboração de propostas para a construção e funcionamento dos Colegiados de Gestão.
A plenária de encerramento representou a maior demonstração da relevância desse grande evento. Pôde-se aí constatar a riqueza e importância das rodas realizada por região, perceber o quanto esse processo é de cada lugar, de cada região, contexto histórico e atores locais, a quem compete pensar as soluções para os desafios que lhes são posto.
Para mim, é extremamente significativo registrar que, somente quando estávamos sentados à mesa de encerramento dos trabalhos, percebemos ter chegado ao fim do encontro.
O envolvimento foi tanto que não nos demos conta do tempo, tão rápido ele passou! Naquele instante fiquei contemplando o ambiente, as pessoas, os rostos e suas expressões e, ao enxergar alguns companheiros e companheiras, perguntava a mim mesma, há quanto tempo estamos juntos? Há décadas! Respondia uma voz interior. Companheiros e companheiras incansáveis de lutas passadas e, por que não dizer, intermináveis! Teresa Freire, Jalila, Cipriano, Betinha, Lavinia, Linete , Gorete, Jacqueline, Petrônio, Liege, Miranice, alguns que em conjuntura política recente tinham iniciado a construção dos Colegiados de Gestão Regional, mas que, por decisões e rupturas políticas locais não puderam dar continuidade ao processo. Continuando a fixar o olhar neles, voltei um pouco mais no tempo e os encontrei novamente, lutando no movimento estudantil, lutando contra a ditadura e pelas liberdades democráticas. Como foi bom perceber que, nesse dia dedicado ao SUS, eles e elas também estavam ali. Fiquei muito tocada ao enxergá-los dentro dessas lembranças, senti carinho por cada um e feliz porque, diante da vastidão do espaço e da imensidão do tempo, continuo a compartilhar com eles esse planeta e essa nova época (parodiando Carl Sagan).
Agora, em casa, pensei na nossa rede, no nosso coletivo da PNH. Afasto-me, então, das lembranças pessoais e me junto a vocês e esse movimento me dá conforto. Lembro que agora não somos apenas 465, ou meu pequeno grupo de amigos, mas milhares de companheiros e companheiras desse imenso país. Todos conectados, solidários, lutando, amando, brigando, quebrando regras indevidas, visando sempre o comum, a defesa da vida e do viver de cada ser. Será que a vida tem outro sentido?
Por Ricardo Teixeira
Querida companheira Sheylla,
Que linda maneira de chegar nessa Rede, afirmando nesse último parágrafo sua plena consciência do sentido dessa Rede e do quantum de amor que ela expressa.
Preciso repetir, como um eco, essas suas palavras tão conscientes do sentido dessa experiência. Você diz: "Agora, em casa, pensei na nossa rede, no nosso coletivo da PNH. Afasto-me, então, das lembranças pessoais e me junto a vocês e esse movimento me dá conforto. Lembro que agora não somos apenas 465, ou meu pequeno grupo de amigos, mas milhares de companheiros e companheiras desse imenso país. Todos conectados, solidários, lutando, amando, brigando, quebrando regras indevidas, visando sempre o comum, a defesa da vida e do viver de cada ser. Será que a vida tem outro sentido?"
E isso num post de estréia (espero que o primeiro de muitos!) de grande força, que traz a notícia de um acontecimento demais importante para a afirmação da dimensão pública da saúde, com o especial significado que isso adquire nesse difícil momento da saúde no estado. Parabéns a você e a todos que têm feito tudo isso acontecer!
Grande abraço,
Ricardo