Canto ao desabrochar de Amandy

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Dia 17 de maio às 19.45 nasceu Amandy. Filho da minha filha Mayana, chegou com muita serenidade. Em um contexto onde tantos falam das impossibilidades de se fazer algo mais humanizado das nossas práticas no SUS, esse menino veio pra nos dizer que se nós os profissionais quisermos, é possível fazermos algo.. Ao chegarmos ainda de manhã no Hospital Público César Calls em Fortaleza. Não havia vagas, mas felizmente muitos movimentos nos ajudaram a ficar e o acesso veio. Queremos manifestar nossa gratidão à rede de amigos e amigas, que foram anjos na articulação do acesso á vaga e á profissional que a acompanhou. À, ex- companheira de trabalho nos Índios Tapea que encontrei no plantão e acompanhou com muita atenção e carinho o processo. À minha amiga de tanto tempo, enfermeira, que chegou com todo seu arsenal terapêutico: do-in, respiração, massagem, bolas, relaxamento, afetuosidade enfim, cuidado integral que não abandonou o posto até que essa nova vida desabrochasse. Junto com ela alguém que ainda não conhecia, enfermeira maravilhosa com jeito doce de menina, lutando pra fazer a humanização funcionar. Fomos improvisando: na maca porque não havia vaga no pré-parto, começou o cuidado, a massagem, a orientação. Depois de um tempo conseguimos um box e levamos um notebook que propiciou a música. Íamos nos alternando minha amiga, a enfermeira de plantão e eu. Outros e outras foram chegando e se envolvendo. A regra do hospital era dieta zero, mas negociamos com a plantonista e pudemos ofertar água de coco. O dia já se ia e a noite chegava. Com ela a chuva, água boa e doce alimentando o ventre da mãe terra. Chuva de Amandy – dia de muita chuva em tupi. No final chegou a médica que a acompanhou, pra que ele chegasse pelas mãos de quem cuidou da sua evolução. Era domingo, seu filhinho estava em casa febril e não era nenhum paciente particular, ou de convênio privado. Do SUS. Ela veio sorrindo pra acalmar a marinheira de primeira viagem que respirava, cansava mas não perdia a serenidade. Mayana, mãe corajosa, tão linda, resistindo ás contrações cada vez mais intensas. Re-ajeitamos a maca, colocamos um arco pra que ela pudesse apoiar -se e ficar semi-sentada. A pediatra também entrou no jogo, a ginecologista do dia ficou mesmo após terminado o seu plantão E eu de avó,-mãe fazendo a minha parte: reiki e dose tripla de carinho que não tem risco de overdose. Por fim chegou, doce, rosado, sem muito alarde. água doce de chuva lavando nossa alma. Nos olhos da mamãe, as lágrimas que as mães conhecem tão bem, de êxtase, de prazer. E ele chegou, pode ficar na barriga da mãe que cortou ela própria o cordão umbilical. E agente entoava o mantra: Amandy!!!! No hospital muito reboliço. Dizia-se no corredor: que parto diferente, que calma, que legal . E eu pensava. Não mudamos a hotelaria, ela foi pra enfermaria e juntou-se ás Marias, com prematuros gemelares. Partilhamos os lanches. Uma acompanhante me emprestou uma cadeira mais confortável. As puéperas se ajudavam , trocavam informações entre si. Pela manhã foram chegando os internos da medicina, da enfermagem, muitos ex-alunos. Que alegria eu percebia quando souberam que alguém nasceu de um jeito diferente porque foi possível articular uma rede amigos, de gente de coração cordial como disse Boff. Ele ainda mamava placidamente nos braços da maravilhada mamãe e as redes de amigos estavam no ar. O pai lá fora aguardava. não conseguimos dessa vez que ele estivesse presente. Mas vamos caminhando. Sei que ao longe outros também cuidavam e somos gratos e gratas a todos e todas.Gratos por compartilharem a alegria de sua chegada. Por fazermos parte de uma família que acredita que é possível nos movermos rumo ao inédito viável de tanto tempo de tanto tempo na construção do SUS, humanizado pela nossa ação protagonista, pela nossa fé na vida e nas pessoas.