Hoje eu li uma passagem inspiradora de “Humano, demasiado humano” do filósofo Nietzsche.
Ele escreveu que não podemos prometer sentimentos porque não controlamos nossos sentimentos. Mas podemos prometer ações.
Nossos gestos podem servir aos sentimentos, mesmo quando eles mudam.
Às vezes, podemos ser fiéis porque não podemos trair um sentimento que mesmo estacionado no outrora, ainda é forte o suficiente para conduzir nossos passos.
Para sempre é tempo demais. A vida humana é curta em tal medida que dá a impressão de que temos um caráter imutável.
Mas se vivermos mesmo, ainda que por pouco tempo, saberemos que o caráter cede a intensidade com que vivemos e, como tudo, muda constantemente.
Eu te amo e te amarei só é possível porque amar é um gesto que precede e sucede o sentimento simultaneamente. Só se pode amar sendo amoroso e sendo amoroso, amar.
Não há gesto sem amor, nem amor sem gesto. O que destrói o amor não é uma escolha. Como em tudo mais, é o esquecimento a grande força destrutiva. Mas, se o tempo é simultâneo, não há esquecimento.
Não se pode esperar o impossível: a imobilidade. Portanto, se for real, não há o que esperar.
Lembre-se de Proust e a memória involuntária em “Em busca do tempo perdido”.
Não mudar é impossível. Mas o amor pode transcender o fluxo do tempo. Passado, presente e futuro: o tempo pode ser continuamente simultâneo. Não há um instante, no passado ou no futuro, que não seja “o” presente simultâneo da totalidade do tempo.
Podemos esperar que eu lembre. Não que eu não mude.
Será a memória que manterá a atualidade dos gestos amorosos?
Quando meus valores, rumos, meus gostos, prazeres e afinidades mudarem, a memória ainda estará lá. Quando, finalmente, a memória se for, então não existirei mais.
Tudo isso é. Mas o que seria o amor se cedesse a essas mudanças da carne?
Tudo se resume na possibilidade de a memória ser eterna e o tempo simultâneo. Perfeito. Só existe memória no presente.
E assim, o passado de algum modo é simultâneo ao presente. O esquecimento pode ser possível, mas a memória mantém a forma eterna do que, tendo acontecido, não pode desacontecer…
Por jacqueline abrantes gadelha
Marco, seus textos são sempre belos. Que maravilha acessar seu blog em qualquer tempo!
Um abraço