Contrariamente ao vivenciado nos anos de 1970 aos 1990, quando o trabalhar em hospitais públicos era prazeroso não apenas pelo status que os cargos conferiam aos profissionais, mas, pela qualidade dos serviços oferecidos e farta disposição de materiais, insumos, equipamentos, comida, medicamentos. A realidade de hoje nos assusta pela falta de tudo, inclusive comida e medicamentos para os pacientes. Por mais que queiramos nos salvar das situações de crise que tem vivenciado a sociedade brasileira, blindados pelo edificante otimismo que todos devemos cultivar, como contribuição para harmonizar a atmosfera pessimista vigente, é inverossímil perceber a indiferença e o descaso dos governos para com serviços de saúde, no Brasil. É inadmissível que se testemunhem serviços de saúde de péssima qualidade oferecidos pela maioria das instituições hospitalares da rede pública, impondo às populações sentenças de morte por maldosa e covarde omissão dos seus gestores públicos.
Não há como explicar, salvo atribuindo-se aos atos de corrupção sistêmica e instalada nas três esferas de governo, tendo em vista que os maiores hospitais públicos da Região Metropolitana do Rio de Janeiro não disponham de materiais, equipamentos, serviços de manutenção e apoio, além de equipes profissionais suficientes para atender suas demandas diárias. O Ministério Público e a Polícia Federal já cumpriram suas partes, todos já compreendemos que o dinheiro que deveria ser aplicado na saúde foi desviado para políticos, empresários, laranjas, agentes financeiros, campanhas políticas etc., inclusive, que tais chefes de quadrilha estão enjaulados. A questão que se coloca é sempre a mesma: Por que o dinheiro não é confiscado e volta imediatamente para onde é preciso?
Digo imediatamente porque quem está doente não tem tempo de esperar pelos trâmites burocráticos da nossa letárgica administração pública, tampouco digere as mazelas operadas nos altos escalões judiciários. Pessoas internadas em unidades de tratamento intensivo não sobrevivem sem respiradores artificiais, medicamentos de última geração resultantes de pesquisas de tecnologia e inovação. Não é plausível do ponto de vista ético a proibição de compras diretas em caso de desabastecimento por incompetência. Deixam-se normas burocráticas de lado, não há tempo para se recorrer aos exaustivos processos licitatórios, quando o injustificável se estabelece e vidas humanas correm risco de ser interrompidas.
Aceitar sem questionamentos a falta de medicamentos vitais para controle de transplantados é uma tortura, posto que os profissionais que atuam em cargos estratégicos deveriam ter formação equivalente, mas essa não tem sido regra devido aos apadrinhamentos políticos. Em administração hospitalar aprende-se que estoques de medicamentos, insumos e materiais hospitalares devem ser estatisticamente controlados em suas planilhas, devendo ser requisitada nova compra sempre que se atinja margem de segurança, calculada com base no consumo médio mensal, trimestral, semestral. Regra de fácil e de simples aprendizado, mas, se inobservada, pode gerar a falência do sistema, como agora.
Argumentos do governo federal que a crise na saúde é pontual, agravada no Estado do Rio de Janeiro em consequência da recente roubalheira nos cofres públicos, não são mais dignos de créditos. Sabe-se que os dois maiores hospitais da capital paulista também estão sendo sucateados. O Hospital São Paulo, da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, está fechando várias unidades ambulatoriais e de internação clínica, cirúrgica e tratamentos especializados. O mesmo se pode constatar no Hospital das Clínicas da USP, sendo desmoronado pela falta de recursos para serviços de atendimento ao público.
Uma vergonha que nos expõe como Nação. Tal situação poderia ser mudada, a partir do momento em que deputados, senadores, juízes, magistrados e o próprio presidente da república, deixassem de ser atendidos no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, entre outros da rede privada, e priorizassem seus atendimentos nos hospitais ode o povo é atendido, como na Alemanha, Suécia, Reino Unido. Ao grupo elitista do empresariado, caso não se sinta à vontade em dividir espaço com pessoas que julguem inferiores, que gastem seus tesouros noutros cenários, sendo sugados, explorados pelo afoito gargalo das instituições privadas do setor saúde. O importante é que a população receba retorno equivalente ao que paga em tributos, porque o trabalhador brasileiro está cansado de trabalhar cinco meses e meio apenas para pagar impostos, e receber serviços públicos similares aos dos países mais pobres do Planeta. Algo precisa ser mudado nessa bagunça!
Wiliam Machado