Uma situação que nos parece espúria em sua própria formulação é a ideia de construir conforto na existência ao custo de eliminar vidas humanas. Por exemplo, consideremos a seguinte metáfora: Para construir uma casa nova, achamos aceitável a perda, por inanição, de 40% dos membros de uma família, entre crianças e idosos. Dado que já se está numa casa e não na condição de exposição aos elementos, que poderia levar a um colapso em que a família inteira poderia morrer, esta situação hipotética é obviamente espúria.
Essa analogia serve à reflexão a respeito dos recursos que estamos acumulando, na forma de capital financeiro, nas contabilidade das mega corporações globais. Não se trata de que o recurso investido na exploração/possível colonização da Lua e Marte seja necessariamente parte do excedente disponível para erradicar a miséria. De fato esses recursos são parte do que temos tecnologicamente como possibilidades concretas para a erradicação da miséria. O mesmo pode ser pensado em relação ao complexo militar industrial das super potências globais, mais especificamente China e EUA. A questão é no que temos investido o capital representado pelas potencialidades tecnológicas que a humanidade vem desenvolvendo ao longo da história.
Se os recursos investidos na exploração espacial não são os mesmos que poderiam ser usados para a erradicação da miséria humana na terra, a questão é onde todo o conjunto do excedente, para a corrida em direção a outros planetas e a erradicação da miséria, estão acumulados. De fato, se podemos ter a “casa nova” sem a perda de parte da humanidade para a fome, porque ainda há miséria?
Trata-se, desse modo, de uma questão de princípios até mais do que de prioridades. O princípio que surge das evidências é evidentemente o da negação da vida. Isso diz muito sobre o que estamos construindo para o futuro e que temos, falsamente, como destino atávico.