Infância e Política
Crianças e política: temas excludentes?
Jens Qvortrup, sociólogo e professor de Ciências Políticas da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, se ocupa desta boa discussão.
Analisando nossa atitude (das culturas modernas e contemporânea) em relação à infância, observa que o "modo protetor a que vêm sendo submetidas as crianças nos dois últimos séculos acaba por afastá-las dos adultos — e dos assuntos sérios da economia e da política".
A proteção beneficiaria as crianças? Ou haveria um ganho para os adultos nessa empreitada? O que se busca nesta proteção, que por pouco não coloco entre aspas?
Qvortrup se pergunta: "Será que haveria investimentos públicos em crianças nas dimensões que alcançam hoje se não houvesse expectativas de um retorno lucrativo?"
O discurso predominante sobre crianças as coloca num lugar mítico. Um "povo estrangeiro" ou um "povo misterioso", como aparece nos poemas e canções do sueco Beppe Wolgers, citado por Qvortrup. Bela acepção que o aproxima de Foucault, ao descrever o modo como os loucos eram vistos na Idade Média. Mas esta dimensão da experiência da infância não a afastaria da convivência com as questões "adultas"? Seria possível incluir uma diferença assim tão radical? Não cairíamos numa espécie de sacralização da infância?
Mas voltemos: Ariès, em seu emblemático "História Social da Criança e da Família", lamenta a perda de posição das crianças na sociedade.
E se as crianças pudessem votar? E se pudessem experimentar-se como sujeitos que contribuem para a sociedade desta maneira mais direta?
As respostas ficam em suspenso. Mas, sem dúvida, há uma grande discussão nunca feita antes por aqueles que se ocupam da infância. Penso nos "especialistas", aqueles que se apossam de um "saber" sem compartilhá-lo socialmente. Qvortrup prossegue: "deveríamos fazer de tudo para protegê-las ao preço de deixá-las fora da sociedade ou deveríamos reconhecê-las como pessoas, participantes, cidadãs com o risco de expô-las às forças econômicas, políticas e sexuais?"
Jens afirma que a presunção de incompetência atribuída `as crianças pela pouca idade não poderia ser um impeditivo para votar. E seus pais, poderiam ser representantes de suas necessidades, votando "por" elas? Hilary Clinton, advogada de crianças há tempos atrás, sugeriu "reverter a presunção de incompetência e reconhecer que todos os indivíduos são competentes até que se prove o contrário".
Boa discussão!!!
Iza
Por Pablo Dias Fortes
Iza, talvez a própria etimologia da palavra "infância" (do latim infans: "sem fala") explique essa imensa dificuldade de a pensarmos junto com a palavra "política". Sabemos, por exemplo, que foram as práticas disciplinares (Foucault) as principais responsáveis não apenas pela consolidação das sociedades ditas "industriais", mas também e sobretudo (natural consequência!) pelo advento das chamadas "ciências humanas". A espacialização individualizada dos corpos foi nosso primeiro modo de organização produtiva, nossa primeira tecnologia fabril de massa: enfim, a alvorada do "indivíduo moderno". Não me surpreenderia se o conceito de "infância" (e não o de "criança") encontrasse aí também algum eco genealógico. Parece que a história só encontra mesmo algum repouso no inconfundível divã de Minerva.
Parabéns pelo post!
Abs,
Pablo