POLÍTICA DE HUMANIZAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE QUALIFICAÇÃO DO SUS – A CONSTRUÇÃO EM FORTALEZA

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O Sistema Único de Saúde Brasileiro comemora 20 anos de criação, e a população reconhece nele grandes desafios a serem superados, mas também importantes avanços conquistados. É, sem dúvida, a maior política de inclusão social do Brasil, frente ao seu caráter de direito universal e dever do estado. Assenta-se em três princípios dogmáticos: a universalidade, a equidade e a integralidade. Neste seu percurso, a materialização destes princípios, e de outros de caráter organizativos, foram possíveis graças a visão de gestores, trabalhadores e segmentos organizados da sociedade, que comprometidos e mobilizados nesta caminhada foram colocando tijolos na construção coletiva do SUS.

A XI Conferência Nacional de Saúde (Brasília,2000) anuncia pela primeira vez o tema da humanização, em seu título: “ACESSO, QUALIDADE E HUMANIZAÇÃO NA ATENÇÃO À SAÚDE COM CONTROLE SOCIAL”, objetivando pautar as agendas das políticas públicas de saúde. A partir de então sistematizam-se práticas humanizadoras, onde o Ministério da Saúde vai estimulando o desenvolvimento de ações inovadoras neste campo.

                    O percurso vai desenhando-se e em 2003, o Ministério da Saúde constitui a sua Política Nacional de Humanização – PNH, redefinindo o seu conceito, compreendendo-a como  uma estratégia de interferência nas práticas de saúde, levando em conta que sujeitos sociais, atores concretos e engajados em práticas locais, quando mobilizados, são capazes de, coletivamente, transformar realidades, transformando-se a si próprios neste mesmo processo. (Benevides & Passos, 2005).

                    Diante do desafio de efetivar os princípios do SUS no cotidiano das práticas de atenção e de gestão, define princípios orientadores para a sua política de humanização, sendo eles: a inseparabilidade entre a atenção e a gestão dos processos de produção de saúde; a transversalidade, e a autonomia e protagonismo dos sujeitos implicados. Este último nos remete ao fortalecimento da participação social no SUS, através da co-gestão, que envolve gestores, trabalhadores e usuários na gestão e atenção à saúde, favorecendo a inclusão, responsabilização e vínculo entre os atores participantes do processo de produção da saúde.

                   A PNH oferece ao país orientações para a construção de metodologias que resulte em  mudanças significativas nas práticas de saúde, sintonizando "o que fazer" com o "como fazer"; sem contudo, desconsiderar iniciativas e protagonismos locais. Assim, oferta diretrizes e dispositivos que orientam o caminho.

A PNH  foi inspiração para que fosse criada, em 2005, a Política Municipal de Humanização em Fortaleza – FORTALEZA HUMANIZASUS, uma iniciativa em favor de mudanças na Gestão e na Atenção à Saúde, entendida como forma de aperfeiçoar o Sistema Único de Saúde – SUS e garantir a defesa da vida e o direito à saúde para os fortalezenses. Tem a proposta de desenvolver ações e estratégias de Conscientização e Educação Permanente para os profissionais do Sistema Municipal de Saúde, com uma metodologia dialógica e participativa, implementando o acolhimento, a co-gestão, a clínica ampliada, a ambiência; valorizando o trabalhador da saúde para a garantia da eficácia e eficiência da assistência. 

Com o objetivo de encontrar soluções coletivas para as dificuldades cotidianas no Sistema Municipal de Saúde de Fortaleza, a Política Municipal de Humanização – PMH foi lançada através do I Curso de Extensão Universitária Fortaleza HumanizaSUS, no ano de 2005, em parceria com a UFC, que reuniu cerca de 5 mil trabalhadores e gestores.

Em 2006, foi estabelecida parceria do Ministério da Saúde (MS), através da Política Nacional de Humanização (PNH), com a Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF)-SMS e com a Universidade Estadual do Ceará (UECE), através de seu Laboratório de Humanização da Atenção em Saúde (LHUAS). Através do I Encontro Municipal de Humanização foram definidos eixos para a Política de Humanização no Município: Acolhimento, a Co-gestão e a Saúde do Trabalhador da Saúde.  A partir disso, houve o desenvolvimento de ações que conduziram a Política Municipal de Humanização.

Muitas das mudanças ocorridas no Sistema de Saúde de Fortaleza, no que concerne a resolutividade, a dimensão relacional e mesmo ao maior respeito e consideração da cidadania, provêm da articulação entre a Política de Humanização e a Política de Educação Permanente, consideradas eixos estruturantes e transversais ao Sistema de Saúde.

Assim, foi instituida uma importante marca quanto a humanização dos serviços, implementando o dispositivo de acolhimento com classificação de risco e vulnerabilidade (ACCR) nas redes de atenção básica, hospitalar e de saúde mental. Vários foram os processos de capacitação, através de oficinas de trabalho, envolvendo gestores, trabalhadores e usuários, oportunidade em que se refletiu sobre a diferença dos processos de trabalho do que seja triagem e acolhimento. Este primeiro, até então muito comum nas práticas de atenção, limitando-se a eleger no momento do atendimento, o que é ou não competência de cada unidade, sem gerar responsabilização e vínculo. Passamos então a fazer uma aposta no ACCR, como "uma ação técnico-assistencial que pressupõe a mudança da relação profissional/usuários e sua rede social por meio de parâmetros técnicos, éticos, humanitários e de solidariedade, reconhecendo o usuário como sujeito e participante ativo do processo de produção da saúde".(PNH – Formação de Apoiadores, 2006).  Passamos a discutir o acesso aos serviços, que de modo geral era organizado burocraticamente, através do atendimento por filas de acordo com ordem de chagada, sem avaliação de risco do agravo e grau de sofimento.

Este processo ocorre implicando outras dimensões da humanização que é a ambiência das unidades, ou seja, o espaço físico adequado ao processo de trabalho, mas também entendendo-a como espaço social, profissional e de relações interpessoais que proporcione uma atenção acolhedora, resolutiva e humana. O fomento as rodas das unidades de saúde, entendendo-as como espaço privilegiado para discussão e tomada de decisão, envolvendo todos os que fazem cada unidade. Isto permite ampliar os níveis de comunicabilidade, aproxima a gestão dos trabalhadores e implica a todos na construção de novos e necessários processos de trabalho no campo da atenção e gestão.

Podemos citar ainda o fortalecimento das ouvidorias hospitalares, na rede própria, como canal de comunicação entre população e gestão; os grupos de trabalho de humanização – GTH’s, que constituem nos hospitais, espaços de discussão das práticas, fomentando iniciativas que estimulam o envolvimento dos trabalhadores como protagonistas da humanização; a integração das cinco redes assistenciais (atenção básica, hospitalar, saúde mental, especializada e de urgência e emergência) a partir do espaço dos territórios regionais, na busca do matriciamento para a resolutividade. Podemos citar ainda as práticas de "cuidando do cuidador", iniciativas locais de cuidado com os trabalhadores de saúde, bem como a discussão e construção de mapas de risco inspirada na atuação dos trabalhadores nas unidades de saúde.

Todos estes passos dados em Fortaleza, ao longo de quatro anos tiveram o objetivo de qualificar o SUS local, estabelecendo uma nova relação dos serviços com a sua população usuária. Foram muitos os processos desencadeados que buscaram melhorar as condições físicas das unidades, mas sobretudo, construir coletivamente novos processos de trabalho e sensibilizar trabalhadores, gestores e usuários do SUS para a efetivação de mudanças para a qualificação da atenção e gestão à saúde no município de Fortaleza. Acreditamos na necessidade de continuar a caminhada, com passos firmes e largos para o fortalecimento da Política Municipal de Humanização, como uma ferramenta necessária à efetivação de serviços acolhedores e resolutivos. Este continua sendo o compromisso da gestão de Fortaleza para os próximos anos. O II Encontro Municipal de Humanização, a ser realizado no dia 22 de novembro próximo, é este momento de reafirmar compromissos, lançando as luzes para a Humanização da Saúde de Fortaleza.

 

Bibliografia

 

ANDRADE, L.O.M. et all. Humanização e Cultura de Paz: Um desafio para o Sistema Municipal de Saúde de Fortaleza (CE). Revista Divulgação Em Saúde para Debate. n. 35 – CONASEMS/CEBES. Rio de Janeiro, 2006.

 

BARROS, R. B.; PASSOS, E. Humanização na Saúde: um novo modismo? Interface – Comunicação, Saúde, Comunicação. São Paulo, 2005.

 

PNH. Cedernos do Curso de Formação de Apoiadores para a Política Nacional de Humanização da Gestão e da Atenção à Saúde, 2006.