PRINCÍPIOS DA COCRIAÇÃO – Será possível uma coisa assim “dar certo”?

16 votos

https://escoladeredes.net/group/co-criacao/forum/topics/principios-da-cocriacao 

PRINCÍPIOS DA COCRIAÇÃO
Publicado por Augusto de Franco em 2 abril 2013 às 7:20 em CO-CRIAÇÃO

A ideia de formular alguns princípios da cocriação surgiu na experiência do Festival de Ideias, uma iniciativa do Centro Ruth Cardoso que começou em 2011 e teve continuidade em 2012 e 2013.

Nas sessões semanais de cocriação promovidas pela iniciativa surgiu a ideia de decorar o ambiente com um cartaz com as seguintes sentenças:

1 – Entrada e tema abertos | Qualquer pessoa pode entrar para cocriar e para propor temas inesperados.

2 – Desfecho aberto | Não há um resultado esperado a ser alcançado.

3 – Processo free | Não há uma metodologia ou um conjunto de passos que as pessoas devam seguir para atingir um objetivo prefixado. Somente livre-conversação!

4 – Estrutura distribuída | Em um campo de cocriação todos interagem em igualdade de condições (não há dirigentes, professores, palestrantes, coordenadores ou facilitadores: todos os cocriadores são netweavers).

5 – Dinâmica interativa | A cocriação não tem procedimentos participativos (como a reunião coordenada, a votação e a construção administrada de consenso). Ninguém precisa acatar decisões. Todos são livres para interagir como quiserem.

Ao ler esses princípios muitas pessoas ficam em dúvida. A primeira pergunta que em geral vem à cabeça de quem nunca participou de um processo de livre-interação nesses termos é:

– Será possível uma coisa assim “dar certo”?

Quando pensam mais sobre isso – sem se integrar ao processo de cocriação – a dúvida inicial só tende a aumentar. E aí vêm os questionamentos:

– Para quê marcar reuniões sem pauta, sem metodologia, sem programação, onde nada é oferecido? Isso não tem nenhuma objetividade e logo as pessoas se cansarão de ir a um lugar desses, sem atrativos, onde as coisas só acontecem se elas mesmas tomarem a iniciativa de produzi-las. Por outro lado, como conseguiremos manter uma atividade assim, sem projetar resultados esperados?

Bem… Nossa experiência tem revelado que não adianta muito dar respostas teóricas para tais perguntas se o objetivo é convencer quem está em dúvida. Não há como ter um entendimento da cocriação sem experimentá-la. A dinâmica da interação só pode ser percebida enquanto interagimos. Como escreveu Johann Wolfgang von Goethe em Poesia e Verdade (1811): “Die Quelle kann nur gedacht werden, insofern sie fließt” (“a fonte só pode ser pensada enquanto flui”) (1).

De qualquer modo, mesmo para os que já experimentaram tal dinâmica, parece haver a necessidade de entender melhor o que de fato acontece quando pessoas interagem livremente para criar ideias. Então resolvemos comentar os princípios da cocriação que surgiram da nossa experiência particular e de outras experiências que estão acontecendo neste momento em numerosos lugares do Brasil e de outros países.

Quem sabe isso também possa ajudar aqueles que precisam de argumentos para apoiar tais experiências (ou, pelo menos, para deixar que elas aconteçam em seus espaços) (2).

O QUE É COCRIAÇÃO INTERATIVA

Cocriação (co-creation) é o processo pelo qual várias pessoas criam (ou desenvolvem) ideias conjuntamente. A cocriação diz-se interativa (ou em rede) quando tem entrada e tema abertos, desfecho aberto, processo livre (sem metodologia predeterminada imposta a todos, embora qualquer grupo seja livre para adotar a metodologia que quiser), estrutura distribuída e, obviamente, dinâmica interativa.

Acontece assim. As pessoas vão para um determinado lugar (físico ou virtual) e lá começam a conversar umas com as outras sobre suas ideias. William Irwin Thompson (1987), em Gaia: uma teoria do conhecimento, escreveu que “as ideias, como as uvas, dão em cacho”. Uma ideia puxa outra, cada ideia namora outras (no plural, hehe), várias ideias são polinizadas por outras formando cachos de ideias congruentes. Se der liga, daí podem sair projetos que serão desenhados e implementados coletivamente. Pronto. Acabou (ou melhor: começou!).

Simples demais. É difícil acreditar que isso possa funcionar. Mas tal simplicidade esconde uma alta complexidade. A cocriação interativa depende de um processo extremamente complexo que chamamos de conversação, em que ideias diferentes se combinam e recombinam, da nossa capacidade de bifurcar (fork) e de abrir nossos próprios caminhos (mow = my own way) para criar novas ideias a partir das ideias que interagiram e se polinizaram mutuamente na conversação.

Algumas pessoas, por mais que tentem, não conseguem ver o sentido da cocriação interativa (ou em rede). Mas esta é a questão central. Ou esse processo acontece de maneira mais centralizada do que distribuída (sob uma hierarquia) ou ele acontece de maneira mais distribuída do que centralizada (em rede). Para entender a cocriação em rede é necessário perceber as diferenças entre campos de reprodução e campos de criação.