Uma leitura da Carta para a presidente Dilma
A carta circula pela internet. Pode ser Fake. Não importa. Ela expressa sentimentos que muitos não confessam, mas endossam plenamente. O título do e-mail que circula vem com esta epígrafe: ESCRITA POR MILTON SIMON PIRES em 03 JULHO 2013 ou Carta do Médico Milton Pires a Dilma.
Não se enganem. Esse tipo de discurso e como o primeiro dominó de uma longa fileira. Este senhor acende uma faísca reacionária. Ele pode se sentir muito inocente. Mas a pólvora que ele incendeia está em outros sítios desta mesma internet. Por lá as coisas são mais duras e muitos falam em pegar em armas e derrubarem o governo a força. Não são apenas os boçais pedindo a volta dos militares. São fascistas militantes começando a se organizar a se comunicar e planejar…
É algo mais violento e niilista.
Curioso que seja justamente por verem seus dogmas mais caros caírem por terra que eles necessitam encontrar culpados. Os mesmos homens que espalham filhos por vários endereços na cidade (e não levam nenhum projeto de vida adiante porque um terço do que ganham é judicialmente dividido por mães em série) são os que dizem que o PT quer aprovar leis para acabar com a família.
Perdoem-me. Mas o que está acabando com a família mononuclear é o genocídio de jovens negros, o encarceramento em massa e as consequências da automatização dos meios de produção material. Isso tornou o trabalho imaterial mais relevante e transformou as mulheres, hábeis produtoras de bens imateriais – como o afeto que anima o cuidado, em "chefes" de família.
O mundo vai mudando ao sabor da emergência de novas tecnologias e sua interação com hábitos culturais humanos. Há muito de acaso e imprevisibilidade em tudo isso. Mas o retrocesso fascista sempre ameaça em cenários de retração ou depressão econômica. Em resumo, ele responde a tendência de buscar um culpado para tudo o que não possa ser remetido a providencia divina.
A julgar pela agenda política contemporânea muita gente espera que o desenvolvimento econômico do terceiro mundo estoure como uma bolha de especulação semelhante a de 1929. Esse é o cenário em que velhinhos inocentes, patéticos conservadores se tornam o fogo da ignição de um refluxo fascista.
Outros apostam em redes distribuídas e economias baseadas em recursos e não no dinheiro. Não há nada de tecnologicamente inviável em sociedades que estejam em simbiose com o seu ambiente. O desenvolvimento econômico é uma meta suicida. Ainda assim, ele anima as plataformas políticas dos partidos progressistas. O desenvolvimento sustentável em um planeta de 7,2 bilhões de habitantes é inviável. Somente uma economia em estado estacionário poderia ser delicada o suficiente com gaia. Mas não. Isso colide com necessidades humanas incontornáveis.
E apesar de determos os recursos para vivermos em paz e abundancia, lutaremos como uma horda de predadores, devorando toda a manada de herbívoros e depois comeremos nossas próprias crias e semelhantes como se o mundo todo fosse insuficiente.
O discurso do "Doutor" Milton Simões Pires dá conta disso. Nada é o suficiente para ele se dar por satisfeito: Enfermeiras "submissas", empregadas domésticas em regime de escravidão, submissão simbólica ao macho alfa e muito mais… Ele teve tudo isso e está amargurado. Amargurado por estar vivo e vendo que seu mundo era apenas uma construção de fé. Algo que como todo o arranjo histórico e social não suporta o sopro natural dos ventos da mudança. Sua infelicidade vem do ódio que sente pela pulsante potência da vida. Onde os arranjos fluem ao sabor dos encontros.
Não há diálogo razoável com neofascistas: O triunfo da diversidade cultural, o respeito as minorias e a tolerância são como os sinais dos tempos para eles. Tudo de bom que se insinua é como a abertura dos selos do apocalipse. Eles anseiam por destruição e ruínas para poderem reificar novamente o mundo patriarcal que está agonizando…
Só é engraçado como humor mórbido.