Ano Novo e “Jornada nas Estrelas”
Quem tem mais de 40 anos vai se lembrar, principalmente se "perdia" parte das tardes navegando junto com o Capitão Kirk na antiga série de TV dos anos 60, "Jornada nas Estrelas". Os episódios eram sínteses das compilações do diário de bordo da espaçonave "Entreprise". Antes de passar os créditos do seriado, O Capitão Kirk falava assim:
“O espaço, a fronteira final. Estas são as viagens da nave estelar Enterprise. Sua missão de cinco anos: explorar novos e estranhos mundos, procurar novas formas de vida, novas civilizações, audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve.”
Assim, a cada episódio, éramos convidados a explorar esses novos mundos. O que um garoto de 9 anos não sabia é que a Enterprise era uma espécie de convite a tolerância mútua. Ao mostrar um caleidoscópio da diversidade de alienígenas e o quanto era difícil porem necessário tomar contato com o desconhecido sem cair no engodo das interpretações equivocadas, Ron Rondebery (roteirista da série) falava dos convulsivos anos 60, das ruas das cidades americanas palmeadas por manifestações contra a guerra do Vietnã, do conflito entre as gerações com a ruptura com a sociedade de consumo proposta pelas muitas expressões da contracultura onde o movimento hippie era apenas a pedra mais brilhante, da luta pelos direitos civis implementada pelos negros tendo como ícones personalidades tão opostas como Malcon X e Luther King.
Embora a série tivesse uma tensão que volta e meia mantinha nossa atenção presa pela violência, o recado era claro: é possível a convivência em conjunto, basta que possamos respeitar nossas diferenças e nos conhecer melhor e, no limite, cerrar fileiras para nos defender do mal destrutivo quando toda forma de diálogo esbarrou no muro da irracionalidade e da barbárie.
Nesse final de ano estou tirando algum tempo para rever os episódios da minha infância. A estética envelheceu com com o tempo. A Enterprise mais parece um bizarro cenário de uma representação teatral improvisada. Ainda assim, as histórias e o carisma dos personagens principais permanecem: a passionalidade do Dr Mccoy (um médico humanista no futuro distante é um bálsamo para nos animar) em confronto com a racionalidade fria de Spok, escravo da lógica para se libertar de todo o sofrimento produzido pela emoção (um lembrete do budismo e de outras filosofias orientais tão em moda na época) e, como fiel da balança, o Capitão Kirk, ora guiado pela razão, ora guiado por suas intuições… demasiadamente humano!
Queria deixar essa mensagem como mensagem de ano novo para tod@s vocês. Acabei descobrindo agora a pouco que estamos meio que viajando na Enterprise, mesmo que não percebamos isso. A espaçonave tem um nome diferente, se chama Terra. Em 2010 estaremos indo "onde nenhum homem jamais esteve". Que possamos continuar explorando novos mundos…tantos mundos existentes aqui pertinho ao alcance das mãos…outros tantos a anos-luz de distância bastando que o exercício da inclusão possa aproxima-los de nós…enfim…que possamos audaciosamente catalogar, coligir, conhecer novas pessoas e reconhecer tudo aquilo que vai mudando naqueles que nos são caros e em nós mesmos. Que 2010 possa cimentar mais um tijolinho da utopia de "Jornada nas Estrelas": conhecimento, tolerância, paz e respeito mútuo!
Por fim, deixo com vocês a saudação do Dr Spoke: "Vida Longa e Prosperidade"!
Por Marco Pires
Cara,
Eu estava revendo os episódios ainda hoje. Sou um otimista como criador do seriado. Adoro dar uma olhada no mundo pela perspectiva dos céticos e pessimistas mas sempre retorno ao meu pé no chão com a cabeça nas nuvens. Gosto de Michel Serres (outro dia li uma entrevista que ele deu ao Ricardo Teixeira e outros em 1999 e já percebi que o Ricardo é multimídia. Por isso ele some da rede as vezes) e leio Johm Gray com atenção. Parece paradoxal mas só me satisfaço quando exponho minhas posições aos seus mais competentes opositores. Saio de alma lavada destas leituras.
Algo como ver Jornada e Planeta dos Macacos, assistir a "lost" e a "Hause". Ser eclético exige estômago e certas concessões ao mau gosto.
Mas é legal ver que em muitas coisas compartilhamos do mesmo paladar para a cultura, seja erudita, seja de massa, se é que esta distinção faz ainda algum sentido.
Dei o voto nº 1 para este post.
Um grande abraço Erasmo!