Sexualidade em Saúde Mental: atenção necessária

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É relativamente recente o uso do termo sexualidade nos espaços de vida cotidiana. Ele não tem o mesmo grau de importância para todos os sujeitos, sua importância social e subjetiva é variável, dependendo de como são definidos e compreendidos em diferentes contextos e período históricos. O presente estudo, de caráter bibliográfico e descritivo, teve como objetivo levantar a importância de se abordar questões de sexualidade em serviços de saúde mental. Foi no final dos anos 60 que se iniciou a emancipação do sexo da essencialidade e da reprodução. A noção sobre o sexo como vida instintiva ou impulsiva começou a ser questionada por teóricos dos movimentos feminista e homossexual, aprofundando a crise do paradigma sexológico.

Normas a respeito de com quem e o que é permitido ou proibido ter relações sexuais existem nas diferentes sociedades, mesmo que variando para cada sociedade e momento histórico. Elas tem um efeito importante e, com frequência, muito negativo sobre o bem-estar material e emocional das pessoas. A sexualidade e as normas no seu em torno tem impactos significativos sobre a educação, trabalho, saúde e, assim, os direitos sexuais se fazem essenciais para os outros direitos humanos. São questões cruciais que hoje estão colocadas para a política de saúde. Isso significa que o poder público deve assegurar nestes campos os meios de educação, promoção e prevenção da saúde, uma política pública de saúde comprometida com a promoção integral dos direitos reprodutivos e sexuais representará uma conquista política, contribuindo para superar suas heranças autoritárias, patriarcais e homofóbicas.

No âmbito da saúde mental no Brasil, a Lei 10.216/2001 regulamenta hoje a assistência e atenta para os vários aspectos da prevenção nessa área. Através de sua Política de Saúde Mental, a partir de uma Reforma Psiquiátrica, o Brasil ganhou reconhecimento internacional. Com a prevenção e atenção às DST e ao HIV/Aids nos serviços de saúde mental, é colocada em evidência a necessidade de novas abordagens da sexualidade e o sofrimento mental e, com este novo olhar, a sexualidade deixa de ser vista como sintoma para ser encarada como algo saudável e desejável, em uma perspectiva de vida e direitos humanos capaz de reconhecer e aceitar a diversidade, e não como mais um fator de discriminação e exclusão.

A literatura traz que a saúde sexual de pessoas com transtornos mentais severos e persistentes não se mostra uma temática de grande investimento dos profissionais de saúde no Brasil, e raros são os estudos realizados com essa população, vista como “assexuada” ou como se possuísse uma sexualidade fora de controle que deva ser coibida. Sabe-se que no Brasil e em outros países latinoamericanos, os profissionais que trabalham em programas públicos dedicados à sexualidade jovem e, cabe estender aqui, à sexualidade em geral, quase sempre atuam com base em suas crenças e valores pessoais apenas ligeiramente informados por esse discurso científico mais típico do século passado, que fora disseminado pela mídia, por políticas públicas e reinterpretado no discurso religioso.

Na área da saúde mental, cada profissional de saúde utiliza um modo particular para se posicionar em relação ao doente mental e, assim, circunscreve uma percepção da sexualidade do mesmo, na imprecisão dos sinônimos atribuídos, onde suas opiniões revelam seu comportamento e seus juízos de valor, direcionando o desempenho desse papel profissional que, à primeira vista, tende a certa neutralidade sobre as manifestações da sexualidade do usuário.

Na literatura também é possível encontrar importantes sinais de preocupação com a sexualidade nesta área, com guias sobre sexualidade e DST/Aids para profissionais e no âmbito da prevenção e atenção, considerando que as pessoas com transtorno mental estão vulneráveis a um maior risco de diversas condições adversas de saúde. Ser vulnerável significa não ter acesso aos meios para se proteger: acesso à saúde reprodutiva e camisinhas gratuitas e de boa qualidade, por exemplo, liberdade para escolher ou propor. Para que o profissional tenha essa compreensão dos sentidos da sexualidade para cada pessoa e garanta a diminuição de suas vulnerabilidades, é fundamental que ele estabeleça uma relação de confiança necessária à interlocução com o usuário no momento da intervenção, que pode ser realizada nos atendimentos individuais ou em grupo, através de oficinas terapêuticas.

Por fim, sabendo-se que abordar questões da sexualidade é quase sempre um desafio e, muitas vezes um incômodo para profissionais de saúde, e que seu entendimento na clientela de usuários de serviços de saúde mental é geralmente incluído no rol de mais uma “loucura”, “excesso”, “falta de limites” e outras simplificações que justificam uma postura repressiva, se torna extremamente relevante uma abordagem dialógica e que abra espaços para que essas pessoas se expressem.

 

Texto apresentado por mim e por Daniela Megliorini Paro (Núcleo de Apoio à Saúde da Família, Chapadão do Sul-MS), ambos membros do coletivo CONCIES (https://www.facebook.com/coletivoconcies), na IX Semana de Psicologia da UFMS, câmpus de Paranaíba.