O FÓRUM SOBRE MEDICALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO E DA SOCIEDADE VEM A PÚBLICO REPUDIAR A MANUTENÇÃO DE VALENCIUS WURCH DUARTE FILHO NA CO

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O Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, juntando-se ao pronunciamento de diversas entidades da área da saúde, vê com extrema preocupação a manutenção do nome de Valencius Wurch Duarte Filho na Coordenação da Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas especialmente se considerarmos o seu histórico ético-profissional carregado de graves denúncias de violação dos Direitos Humanos à época em que foi diretor do maior manicômio privado da América Latina, a Casa de Saúde Dr. Eiras, no Rio de Janeiro. Esses aspectos foram devidamente explicitados em carta subscrita pelo Fórum sobre Medicalização, entre outras inúmeras entidades de peso no campo da Luta Antimanicomial e da Reforma Psiquiátrica, e entregue na audiência com o Ministro da Saúde no dia 10 de Dezembro de 2015[i].

Chama-nos a atenção o posicionamento contrário de Valencius à continuidade e plena efetivação da Reforma Psiquiátrica, mesmo sendo ela um processo democraticamente construído, intersetorial e referendado internacionalmente, com amplo reconhecimento da sua importância por parte dos usuários da rede de atenção psicossocial, seus familiares e também profissionais e pesquisadores da área.

Nesse cenário, é inevitável pensar que estamos diante do risco de um grave retrocesso no campo das políticas públicas de saúde mental, uma vez que o novo coordenador representa a obsoleta lógica hospitalocêntrica que, além de gerar mais custos ao Estado, tem se mostrado pouco efetiva, e até mesmo iatrogênica, na promoção da saúde mental de usuários e usuárias, tanto no Brasil como em outros países.

Não surpreende que o único voto de confiança à indicação de Valencius tenha vindo da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), que ainda considerou como ‘inadequada e intempestiva’[ii] a ação dos movimentos sociais, sobretudo o da Luta Antimanicomial.

O Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade relembra que a ABP vem tentando deslegitimar qualquer movimento social, profissional e científico que não compartilhe dos pressupostos da saúde mental a partir do ponto de vista neurobiológico, este, aliado a uma determinada corrente da psiquiatria estadunidense e muito favorável aos interesses da indústria farmacêutica.

Destaque também deve ser dado à tentativa da ABP, desde 2012, de criminalizar o movimento do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade e da Luta Antimanicomial com a tentativa de inserção na legislação brasileira do suposto crime de “Psicofobia”[iii], que, embora se apresente sob a ótica de evitar o preconceito às pessoas em sofrimento mental, acaba por intensificar a medicalização e patologização da vida e coagir profissionais da saúde e da educação que se mostrem críticos a esses processos.

No tocante a essa questão, é importante ressaltar três pontos:

a) a concepção de saúde defendida pelo Projeto de Lei da Psicofobia é diametralmente oposta ao modelo comunitário defendido pela RAPS (Rede de Atenção Psicossocial) e pela Lei 10.216 de 2001, que já garantem os direitos da pessoa portadora de transtorno mental;

b) a interferência do Projeto de Lei da Psicofobia no cotidiano escolar acabaria por fortalecer as práticas medicalizantes e psicopatologizantes em torno dos supostos transtornos de aprendizagem como Dislexia e TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade),

c) a possível entrada em cena de medidas persecutórias contra profissionais que se neguem a seguir o disposto estigmatizante do projeto de Lei.

Preocupa-nos a reiteração de uma visão reducionista tanto do sofrimento, quanto do desenvolvimento humano, a qual desconsidera os múltiplos determinantes dos problemas que fazem parte da vida e da escolarização. Tal nomeação revela-se ainda mais controversa e destituída de coerência se consideramos que o Mercosul[iv], o CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente)[v], o Conselho Nacional de Saúde[vi] e o próprio Ministério da Saúde[vii] vem desenvolvendo ações no sentido de reverter o quadro de ultramedicalização de crianças e adolescentes que são acometidos por supostos problemas de aprendizagem e de comportamento escolar.

Consideramos de fundamental importância lembrar que os espaços de disputa que o Projeto de Lei da Psicofobia e a ABP querem silenciar são os espaços públicos, potencialmente construídos por múltiplos saberes e experiências cidadãs, tanto no campo da Educação como na Saúde Mental.

Se, historicamente, manicômios e escolas serviram como espaços de controle e adequação social, vemos que estes também se mostram espaços de mudança e de potência, bastando lembrar as recentes ocupações das escolas públicas em São Paulo e Goiás por estudantes em prol de uma educação pública organizada a partir das demandas dos estudantes, professores e comunidades.

Assim, diante de um cenário que aponta para um provável retrocesso, cabe questionar: a quem interessa a saúde mental ficar isolada do território conforme definido pela RAPS? A quem interessa escolas nas quais não se problematizam marcadores da diferença? A quem interessa a patologização e a medicalização da educação, da saúde mental e da vida?

Convocamos para a luta contra toda forma de aprisionamento, de coerção à diversidade e de autoritarismo!

Juntemo-nos às lutas de estudantes, usuários e profissionais que mostram a vitalidade da ação política mesmo diante das lógicas coercitivas!

Os efeitos de uma possível lógica manicomial junto aos povos indígenas que lutam contra a sua dizimação e etnocídio também nos preocupa. Estamos com os povos indígenas e tradicionais pela afirmação da vida e dos seus territórios!

Contra os processos de medicalização e patologização da vida! Pela plena efetivação da Reforma Psiquiátrica, no Brasil! Pelo fim da lógica manicomial nas RAPS!

Por uma sociedade sem manicômios!

Toda a força à Ocupação Fora Valencius!

 

[i] https://www.abrasco.org.br/site/2015/12/nota-publica-cgmadms/

[ii] https://www.abp.org.br/portal/wp-content/upload/2015/12/nota.pdf

[iii] https://medicalizacao.org.br/projeto-de-lei-da-psicofobia/

[iv] https://medicalizacao.org.br/raadh2015/

[v] https://medicalizacao.org.br/conanda-publica-resolucao-alertando-os-perigos-da-medicalizacao-na-infancia-e-adolescencia/

[vi] https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes/2015/Reco019.pdf

[vii] https://medicalizacao.org.br/ministerio-da-saude-publica-recomendacoes-sobre-o-uso-abusivo-de-medicamentos-na-infancia/

 

 

Da página do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade