Experiências e experimentações que vem do sul

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Lendo o Post "Experiências e experimentações" fiquei muito inclinada a relatar a experiência que vivemos na emergência do Hospital Nossa senhora da Conceição (HNSC). O grupo, formado por enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares administrativos, assistentes sociais, seguranças e muito raramente médicos, que trabalham diretamente com o acolhimento e o primeiro atendimento ao usuário, reúne-se quinzenalmente desde março de 2009 para discutir os processos de trabalho e junto com os gestores buscar a melhor solução, naquele momento, para determinado problema. Acredito que, no que diz respeito a construção do coletivo, nós que trabalhamos na porta de entrada estamos muito avançados. Talvez, em função das condições adversas da porta de entrada de uma emergência que está sempre de portas abertas e que não recusa atendimento para nenhum usuário, tenhamos sido impelidos a unir forças. Sendo assim, conseguimos perceber com mais clareza que o nosso trabalho somente tem sentido quando produzimos juntos e que os resultados mostram-se com mais facilidade se conjuntamente buscarmos o melhor modo de encaminhamento possível naquela situação, o melhor encaminhamento que dispomos naquele momento, a melhor avaliação daquele caso e  o menor desgaste quando não sabemos o que fazer. E confesso, não são poucas as situações em que não sabemos o que fazer pelo usuário. Como por exemplo, os casos em que o usuário está há meses tentando entrar no sistema, aguardando agendamento em uma especialidade de que não dispomos e não temos como resolver.

Além disso, esses encontros do grupo mobilizam os nossos sentimentos, afetamos e somos afetados pelos relatos. Na semana passada, por exemplo, quando falamos da resistência de alguns colegas do serviço para a implantação da visita ampliada, uma colega que recentemente teve seu pai hospitalizado começou a chorar lembrando-se de como isso fazia realmente diferença, tanto para o usuário como para o familiar.   

Felizmente, desde que me tornei apoiadora institucional da PNH experencio com o grupo da emergência a construção do protagonismo. E posso dizer que os trabalhadores da emergência fazem isso muito bem quando estão motivados para isso. O que é mais difícil é fazer com que os gestores à moda antiga aceitem esse protagonismo do grupo.  E nesse processo de "tomada de espaço" vamos fazendo gradualmente tentativas de inclusão das ricas percepções dos trabalhadores e, aos poucos, ampliamos a nossa participação nas decisões que envolvem os processos de trabalho. Nos encontros falamos dos casos que resolvemos e dos que não resolvemos, dos pontos críticos, das dificuldades de comunicação, das descobertas e conquistas do grupo. Inicialmente, estavam amarrados a figura da apoiadora institucinal e nos dias em que eu estava impossibilitada de ir não saía o encontro. Esse também foi um processo e hoje o grupo se libertou, não está mais atrelado a uma pessoa, a um líder, uma figura central, é um grupo que se encontra para falar e fazer rodar a palavra, compartilhar as experiências ricas e cheias de sabedoria de cada trabalhador da emergência.

Não são muitos os elogios que recebemos no nosso dia a dia de trabalho, mas garanto que em cada olhar de admiração diante do trabalho do outro e da sua importância surge um sentimento de gratificação. Não preciso nem dizer que adoro o que faço apesar de não ser uma tarefa fácil, pois muitas vezes ouvi que o meu esforço não seria suficiente para gerar mudanças. Hoje sei que a maior conquista do grupo é o protagonismo, é o trabalhador poder tomar a palavra e contribuir para melhoria do nosso serviço.