COMO INSTAURAR A HUMANIZAÇÃO NOS SERVIÇOS DE SAÚDE?

15 votos

Autores: Lucas Furlan, Alex Sandro Silva.

A insatisfação dos trabalhadores da saúde, perda da eficácia das práticas de cuidados e a gestão já ultrapassada são fatores chaves para o desenvolvimento de problemas nas equipes de trabalho nos serviços de saúde e com isso a relação da sociedade com a saúde tende a ficar comprometida. Assim sendo, esse texto propõe uma reflexão influenciada pelo artigo de Dário Frederico Pasche, intitulado “Pistas metodológicas para se avançar na humanização dos hospitais no Brasil”.

 A PNH (Política Nacional de Humanização) apresenta-se como uma proposta de mudanças nos hospitais do SUS que visa produzir novos métodos de gerenciar, fazer a manutenção e agir, inclusive em direção a ressignificações na forma de ver e viver a vida dos indivíduos que trabalham e/ou utilizam os serviços de saúde, bem como valorizar e fomentar a autonomia e protagonismo dos diferentes sujeitos, acrescentando uma aposta no trabalho coletivo na direção de um SUS acolhedor resolutivo e confortável para todos. Paralelamente a isso, outro objetivo que é a sustentabilidade financeira do SUS que, segundo Pasche (2011), pode ser alcançada por esse meio, inclusive critica as perspectivas da PNH como apenas um movimento vanguardista, dizendo que se assim fosse, uma vez afastada da gestão veria de longe a destruição do que visou instaurar pelas forças nocivas que tentou superar. Eis aqui uma crítica àqueles que julgam a humanização apenas como um simples movimento ideológico irrelevante.

Diante de objetivos como estes é normal surgirem desafios e um desses para a PNH, com a sua nova forma de ver a promoção e manutenção da saúde, foi conseguir ganhar espaço nesse meio, necessitando criar zonas de sentido para ser vista como uma prática renovadora e uma direção ética e política que indicasse certo método de ação frente aos desafios e problemas persistentes no SUS. Então, fez-se necessário que a humanização fosse vista através de dois aspectos, um conceitual onde foi delineada a teoria que embasou o sentido do humanizar e outro metodológico que propôs formas de ação para que a teoria conseguisse se converter em manifestações reais e úteis. Ambas as características resultaram em uma capacidade de resolver problemas tanto no campo da gestão quanto do cuidado para com a saúde, inicialmente destruindo e ressignificando o modelo da medicina moderna de ver a doença como anátomo-fisiológico como traz o livro intitulado “A Psicologia em diálogo com o SUS” (SPINK, 2010) ou conceito-sintoma como descreve o artigo de Pasche (2011). A PNH caracteriza a doença para além dos fatores mencionados anteriormente, pois acrescenta a eles um olhar subjetivo a cada indivíduo com suas necessidades particulares que podem ir além do cuidado medicamentoso e estenderem-se, inclusive, a aspectos afetivos.

Os princípios da PNH são a benevolência, cordialidade, hospitalidade e interação harmoniosa entre sujeitos. Frente a eles o artigo de Pasche (2011) critica a posição degradada da gestão e práticas hospitalares que vão contra qualquer um destes, afirmando que evitar a humanização seria sustentar movimentos políticos-institucionais que não colocariam em questão os modos de organização e gestão do trabalho dos serviços de saúde, ou seja, as metas da PNH. Diante destes princípios, a PNH formulou um método chamado de Método da Tríplice Inclusão, sendo que este é orientado pelas premissas éticas e políticas do SUS. Esse método visa em primeiro lugar a inclusão dos sujeitos, a inclusão dos coletivos e por último avaliar quais as perturbações que essas inclusões provocam nos modos de gerenciar e nas relações clínicas dentro dos serviços de saúde, sendo essa última avaliação um dos pontos principais que nortearão todo o processo de gerenciamento da humanização.

Sobre as “Pistas metodológicas para se avançar na humanização dos hospitais no Brasil” o artigo de Pasche (2011) apresenta quatro. A primeira consiste em “ampliar a experiência democrática na gestão dos hospitais” visando barrar o gerenciamento vertical que culmina em relações de poder que baixam a capacidade dos trabalhadores de diferentes setores e profissões na área da saúde de partilharem e produzirem um campo comum e mais completo a partir de seus conhecimentos e perspectivas diferentes. A segunda denota a importância da ampliação da ação clínica compartilhada e corresponsável entre os trabalhadores, tendo como meta a interdisciplinaridade, ou seja, interação e comunicação em direção à ação norteada e motivada por objetivos em comum. A terceira indica o desenvolvimento de estratégias que incluam não só os usuários, mas também a sua rede sociofamiliar de cuidado, objetivando assim integrar as redes afetivas na gestão e criação de estratégias de enfrentamento de problemas e promoção de saúde e cuidado de si. Por último, mostra que a ampliação e qualificação da presença, inserção e responsabilidade do hospital da rede de saúde se fazem necessárias, pois o hospital como uma rede é um importante recurso para a produção de saúde, o que influencia fortemente a qualidade de vida da sociedade. Nesse sentido, a redução de gastos, geralmente vinculados aos cuidados secundários e terciários da saúde, poderia ser feita mediante investimento de atenção e ação visando a eficiência da área primária do atendimento em saúde, voltada a profilaxia (BLEGUER, 1984) ou prevenção de problemas através da educação à saúde antes que venham a se desenvolver maiores problemas e seja necessário maior investimento. Logo, isso demonstra a necessidade tanto da qualificação quanto da ampliação da responsabilidade e presença dos hospitais na sociedade enquanto pertencentes a rede de saúde.

Em suma, é preciso fazer emergir a compreensão da necessidade de incluir e integrar as múltiplas práticas da área da saúde através de discussões, análises e tomadas de decisões norteadas por consensos estabelecidos por meio de relações não verticais e muito menos horizontais, mas transversais onde se é valorizado as relações de poder e existem fronteiras entre os saberes, entretanto fronteiras permeáveis que permitem aos componentes subjetivos das instituições interagirem e agirem em direção à saúde de forma sinérgica.

Tal tarefa, não fácil, deve ser permeada por interações e comunicações que venham a estabelecer uma forma de gerenciamento e ação voltada a promoção e manutenção da saúde, sendo isso fortemente dependente do espírito crítico interdisciplinar entre as múltiplas perspectivas dos profissionais da saúde tanto em relação às formas de direcionar a atenção ao usuário dos serviços de saúde quanto à forma de gerenciamento das instituições de saúde, no caso do artigo de Pasche a hospitalar.

 

“Cremos que a promoção de espaços para discussões
pautadas nas perspectivas aqui apresentadas são fatores
cruciais para o processo de humanização”.

 

Referências

BLEGUER, José. Psico-Higiene e Psicologia Institucional. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1984).

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas / Atenção hospitalar. Brasília: Ministério da Saúde, 2011.

SPINK, Mary Jane Paris. A Psicologia em diálogo com o SUS: prática profissional e produção acadêmica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010.