FÓRUM SOBRE MEDICALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO E DA SOCIEDADE POSICIONA-SE CONTRÁRIA À ATUALIZAÇÃO DO PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS PARA PESSOAS COM COMPORTAMENTO AGRESSIVO NO TRANSTORNO DO ESPECTRO DO AUTISMO
A CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sus – abriu para consulta pública, até o dia 27 de Dezembro, uma proposta de atualização do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para pessoas com comportamento agressivo no Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), atendidos no Sistema Único de Saúde (SUS), “com recomendação preliminar favorável à publicação da atualização deste Protocolo”. No documento, considera-se a possibilidade do uso de Eletroconvulsoterapia (ECT) e estimulação magnética transcraniana (EMT) para tratamento “do comportamento agressivo no TEA”.
Os retrocessos intensificados pelo governo federal estão por todos os lados. As tentativas de desmonte das políticas implementadas a partir do movimento da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, com o desmonte das Redes de Atenção Psicossocial, a generalização do financiamento público de Comunidades Terapêuticas, o desprezo pelo trabalho multiprofissional em favor da lógica médico-centrada, o retorno da lógica manicomial, com uso de eletroconvulsoterapia, das internações compulsórias, são reatualizações das práticas higienistas que negam a diversidade àqueles/as que não se submetem à padronização da lógica vigente.
Em um contexto em que o número de diagnósticos de TEA cresce exponencialmente, englobando categorias com níveis diversos de acometimento, em que o próprio diagnóstico pressupõe um modelo único de vida em sociedade e para o trabalho, faz-se necessário o posicionamento contra essa naturalização da produção de diagnósticos. Esses, muitas vezes são selados baseando-se em um conjunto de sintomas aparentes, desvinculados das histórias de cada sujeito,a partir de duas ou três consultas, imprimindo no sujeito a sujeição a uma vida pautada em um diagnóstico de deficiência em uma sociedade capacitista. A presente crítica soma ao necessário questionamento dos tratamentos farmacológicos e não-farmacológicos que sugerem a possibilidade de adequação de todas, todos e todes a um único estímulo do que é ter interesse, ter atenção e ser produtivo, que pressupõe padrões abstratos e ideais imaginados ora pelas políticas sociais, ora pelos cuidadores, ora pela sociedade, todes imbricades e indissociáveis em muitas métricas.
Somos contra a inclusão da referência da ECT e do EMT em PCDTs pelo fato destes serem importantes documentos de indução de tratamento e de políticas públicas e, como tais, não devem validar tratamentos experimentais diretamente ligados a interesses corporativos e da indústria de insumos de saúde. Esse conflito de interesses se torna ainda mais grave por permitir que se instaure, no contexto brasileiro, a validação do uso da ECT e EMT como parte do tratamento de comportamentos agressivos de pessoas com TEA. Vale perguntar, para quais pessoas, com quais históricos e em que contextos? E o que será considerado agressividade, numa sociedade racista e preconceituosa que insiste em rotular constantemente crianças pobres e negras, especialmente meninos cisgêneros negros como criminosos em potencial?
Acesse o link, se posicione. Some-se a essa luta. Nós, do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, nos posicionamos contráries à “Recomendação preliminar da Conitec: Favorável à atualização do Protocolo”.
Defendemos que todas as crianças possam existir com a garantia de plenos direitos para crescer de forma saudável, livre e plural.
Abaixo a medicalização da vida!
http://conitec.gov.br/consultas-publicas
*Recordemos: A primeira técnica de psicocirurgia foi criada em 1935, pelo neurologista português Antônio Egas Moniz, e consistia em cortar tratos de fibra entre o tálamo e o lobo frontal, usando uma faca especial chamada um leucótomo. A técnica era realizada com a alegação de melhorar sintomas advindos de doenças mentais. Inclusive, Moniz recebeu o prêmio Nobel por isso. Os cirurgiões americanos Walter Freeman e James Watts desenvolveram um método de psicocirurgia chamado Lobotomia, que consistia em dar uma batida com um picador de gelo no crânio da pessoa. A Lobotomia produzia pessoas apáticas, verdadeiros zumbis, sendo usada inclusive em crianças com mau comportamento. Ela foi sendo descartada progressivamente por ser considerada um procedimento violento e de caráter irreversível, baseado em evidências escassas e pouco rigorosas, sendo abandonado pela maioria dos países a partir da década de 1950. Estima-se que entre 1945 e 1956, mais de 50.000 pessoas passaram por esse procedimento pelo mundo inteiro. Atualmente, alguns países do mundo ainda praticam a psicocirurgia, apesar das diversas críticas recebidas. Mesmo não sendo mais realizada com picador de gelo, mas com modernos computadores e técnicas biomédicas, a ideia subjacente é a mesma. Assim, a ECT e a EMT seguem na mesma trilha histórica da psicocirurgia e da lobotomia, como procedimentos de normatização da infância, controle de comportamentos nomeados agressivos, padronização de um modo específico de ser criança. Dessa maneira, manifestamos nossa preocupação e questionamos o uso de tais procedimentos.
Por auriceia geralda da silva costa
Para que imputar sofrimento?. Que haja respeito e politicas efetivas de inclusão para esses queridos, queridas e seus cuidadores.