Já passaram mais de 10 anos. Um paciente entrou em surto. Estávamos no terraço de um prédio.
Era um evento do movimento da reforma psiquiátrica. Cheguei quando o paciente estava tentando se jogar.
Vi um rapaz agarrado nele. Um jovem psicólogo, alto e magro, meu amigo e colega do Serviço Residencial Terapêutico onde trabalho até hoje. O paciente era mais forte.
Segurei ele por um braço e coloquei minhas pernas para pressionar uma das pernas do paciente. Ouvi meu amigo dizer “Vou junto! Se você conseguir, eu vou junto”.
Senti a resistência do paciente ceder. Seus músculos afrouxaram. Vencemos. Dali para a frente, foi conversa e lágrimas. Nunca me esqueci.
Estar com alguém, estar de fato junto, colocar-se ao lado de quem sofre sempre exigiu de nós esse gesto radical de até mesmo se deixar levar para o abismo.
Antes da pandemia eu sabia que estar com meus pacientes, no hospital ou atravessando uma rua, nos colocava em uma comunhão de destino.
É assim, com essa memória, que reverencio meus muitos colegas que sofreram e com os que morreram de Covid-19 ao atender aqueles que precisaram de seus cuidados.
Por Emilia Alves de Sousa
Linda narrativa Marcos! Forte e emocionante! Me transportei para o cenário e vi você nesse gesto tocante de cuidado com seu paciente!
Bela iniciativa!
AbraSUS
Emília