Referência e contrarreferência promovendo a integralidade na ESF para as gestantes com trombofilia

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     No dia 14 de outubro, eu e meus colegas, estudantes de Medicina, da Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE), no Campus de Presidente Prudente, acompanhamos a “conduta interprofissional” de um pré-natal, realizado na Unidade de Estratégia de Saúde da Família Dr. Kasumaro Mushá, no bairro Jardim Morada do Sol. A avaliação das gestantes segue o Modelo da Clínica Ampliada tem foco em aspectos biopsicossociais. Dessa maneira, os acadêmicos migram do “Modelo Biomédico”, ficado na “doença”, para a “Medicina Centrada na Pessoa da gestante”.

     No pré-natal, os fatores de risco gestacional podem ser prontamente identificados no decorrer da assistência desde que os profissionais de saúde estejam atentos a todas as etapas da anamnese, exame físico geral e exame gineco-obstétrico e podem ainda ser identificados por ocasião da visita domiciliar, razão pela qual é importante a coesão da equipe.

     Gestação de alto risco é “aquela na qual a vida ou a saúde da mãe e/ou do feto e/ou do recém-nascido têm maiores chances de serem atingidas que as da média da população considerada”. Uma das doenças que é fator que corrobora a gestação de alto risco é a trombofilia, doença que tivemos a oportunidade de acompanhar no pré-natal da Unidade do Jardim Morada do Sol.

     A trombofilia é definida como tendência à trombose, que pode ocorrer em idade precoce, ser recorrente e/ou migratória. Classicamente, a trombofilia é dividida em adquirida, representada principalmente pela síndrome antifosfolípide (SAF), e hereditária.

     São indicações para investigação a ocorrência passada ou recente de qualquer evento trombótico, aborto recorrente, óbito fetal, pré-eclâmpsia, eclâmpsia, descolamento prematuro de placenta e restrição de crescimento fetal grave, além de história familiar. A gestação, muitas vezes, é a única oportunidade para a investigação destes fatores. A identificação dos mesmos e seu tratamento podem mudar drasticamente tanto o resultado da gestação quanto a sobrevida e qualidade de vida da mulher em idades mais avançadas.

TROMBOFILIA ADQUIRIDA OU SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE

DIAGNÓSTICO

A SAF caracteriza-se pela presença de um ou mais anticorpos antifosfolípides (anticorpo anticardiolipina, anticoagulante lúpico, antibeta2 glicoproteína I), positivos em dois exames, com intervalo mínimo de doze semanas entre eles, associados a pelo menos um dos seguintes critérios clínicos:

  • Um ou mais episódio de trombose venosa ou arterial (imagem ou evidência histológica);
  • Morbidade obstétrica:
  1. Três abortamentos precoces inexplicados;
  2. Óbito fetal com mais de dez semanas com produto morfologicamente normal;
  3. O parto prematuro antes de 34 semanas com pré-eclâmpsia, eclâmpsia ou insuficiência placentária.

TROMBOFILIA HEREDITÁRIA

            Decorre da presença de mutações em fatores envolvidos com a coagulação, que levam à tendência de trombose. As manifestações clínicas são similares àquelas da trombofilia adquirida.

Os critérios para o diagnóstico dos fatores de trombofilia hereditária são:

  • Deficiência da proteína C: atividade inferior a 72%;
  • Deficiência da proteína S: atividade inferior a 55%;
  • Deficiência da antitrombina: atividade inferior a 85%;
  • Fator V de Leiden, G20210A-FII: heterozigota ou homozigota;
  • C677T-MTHFR: homozigota com elevação da homocisteína sérica.

CONDUTA PARA SAF E TROMBOFILIA HEREDITÁRIA

     As gestantes com síndrome antifosfolípide ou trombofilia hereditária devem receber anticoagulação profilática. A profilaxia deve ser iniciada, preferencialmente, na segunda fase do ciclo menstrual de possível concepção, e mantida caso a gestação aconteça. Se a gestação ocorrer na ausência da profilaxia, ela deve ser iniciada o mais precocemente possível.

MEDICAMENTOS QUE PODEM SER UTILIZADOS NO TRATAMENTO

     A ASPIRINA, utilizada de forma isolada, é reservada para as mulheres portadoras de anticorpo anticardiolipina fracamente positivo, desde que haja antecedente clínico ou obstétrico. A dose preconizada é 80 a 100mg por dia via oral. O uso da aspirina deve ser suspenso, no mínimo, duas semanas antes do parto. Assim, recomenda-se a manutenção da mesma até 34 a 36 semanas de idade gestacional, a depender do prognóstico de parto).

     A HEPARINA DE BAIXO PESO MOLECULAR deverá ser aplicada por via subcutânea e as doses são 40mg por dia para enoxaparina, OU 5.000 UI por dia de dalteparina OU 1.850 UI por dia de nadroparina.

AVALIAÇÃO DA VITALIDADE FETAL

     A avaliação da vitalidade fetal em gestantes com trombofilia adquirida ou hereditária deve incluir o controle diário dos movimentos fetais a partir de 28 semanas de idade gestacional, cardiotocografia semanal a partir de 30 semanas e ultrassonografia mensal com dopplervelocimetria de cordão umbilical a partir de 28 semanas.

CONCLUSÃO

     A “referência e a contrarreferência em saúde” são mecanismos do Sistema Único de Saúde (SUS), que favorecem a troca de informações na rede de atenção, o trânsito da usuária no sistema, e a continuidade do cuidado, portanto é considerada uma potente ferramenta que promove a prática integral na saúde.
Embora a gestante tivesse sido encaminhada à Gestação de Alto Risco, ela continuou sendo atendida pela equipe interprofissional da ESF.

      Os acadêmicos consideraram como positiva a análise do Sistema de Referência e contrarreferência, estimulada pela Metodologia Ativa da Problematização, com foco na Gestação de Alto Risco, em ESF do interior paulista

BIBLIOGRAFIA

BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE. Manual técnico da gestação de alto risco. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/gestacao_alto_risco.pdf. Acesso: 25 de outubro de 2021.

BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE. O que caracteriza uma gestação de alto risco?. Disponível em: https://aps.bvs.br/aps/quais-os-criterios-utilizados-para-estratificar-uma-gravidez-como-sendo-de-risco/. Acesso: 25 de outubro de 2021.