Cadernos Deligny
volume I / número 1 / janeiro 2018

foto / arquivos pessoais de Gisèle Durand

O Laboratório de Sensibilidades nos brinda sempre com publicações avant la lettre como esta sobre a publicação dos Cadernos Deligny. Agradecemos muito por ampliar as redes e nos colocar em contato com a abordagem de conteúdos de forma sempre instigante e inusitada.

O primeiro volume dos Cadernos Deligny condensa a produção do Encontro Internacional Fernand Deligny de agosto 2016. Deligny propõe e experimenta a vida com indivíduos radicalmente diferentes daqueles tidos como “normais” não a partir de instituições específicas, mas na vida, uma abertura para uma legítima inclusão de outras subjetividades.

O perspectivismo antropológico de Deligny funda sua pesquisa então em primeiro lugar em uma pesquisa por outras ferramentas, outras formas de descobrir e de expor o que ele mesmo chama de outros “modos de ser”. Essa exposição é tanto concebida como uma maneira de dar visibilidade a modos de existência excessivamente díspares em relação à imagem icônica do adaptado, quanto como uma forma de crítica a essa mesma imagem icônica, a esse “modo de ser” dominante do homem ocidental capitalista de matriz europeia. Deligny teoriza uma via de mão dupla entre o “humano” e o “homem-que-nós-somos”. O conceito de “humano”, com forte inspiração levi-straussiana é concebido como uma “reserva virtual” de uma “diversidade de formas”; o “homem-que-nós-somos” é compreendido, por sua vez, como uma forma atual e cristalizada do humano e que se vê como a única possível, tendendo assim a uma universalização, a uma totalização mortífera. Humano e homem-que- nós-somos são duas formas imutáveis, em tensão constante, em uma dialética infinita e insolúvel: o“humano” é uma imagem liminar, imagem do sem-imagem, enquanto o “homem- que-nós-somos” é uma imagem icônica que todo e cada um deve supostamente incorporar, a qual todo e cada um deve tender
“mesmo que virtualmente”.
Escritas, antropologia, prática artística e clínica se veem subitamente entrecruzadas, dificultando a possibilidade de dar um estatuto definitivo às práticas, ou melhor, às
tentativas de Deligny e em particular àquela junto a crianças autistas nas Cevenas. Uma dimensão dessa prática condensa esses diferentes aspectos. É a atenção primordial ao lugar, ao
espaço. As áreas de convivência são áreas instaladas; são
instalações de um meio, onde objetos e corpos podem se inscrever, se movimentar e conviver. Se o espaço não é instalado exclusivamente para as crianças autistas, ele é, no entanto, instalado tendo em consideração uma ordenação territorial e temporal que lhes é propícia.

( trecho da introdução ao encontro, por Marlon Miguel em “O materialismo deligniano” – em https://cadernosdeligny.jur.puc-rio.br/index.php/CadernosDeligny/article/view/30/37 

PDF de todos os artigos aqui:

https://cadernosdeligny.jur.puc-rio.br/index.php/CadernosDeligny

 

Veja as publicações da RHS sobre o autor e o encontro:

https://redehumanizasus.net/95297-encontro-internacional-fernand-deligny-com-em-torno-e-a-partir-de-tentativas-25-27-de-agosto-2016/ 

https://redehumanizasus.net/95132-em-busca-de-uma-vida-em-comum-com-individuos-radicalmente-diferentes/ 
Abaixo o vídeo do Encontro de 2016