Vivência no CAPS II Dr. Rostan Silvestre na cidade de Maceió

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DESEJO DE UM USUÁRIO DO CAPS PARA 2O23  ✍🌎🧠 (clique no título para visualizar)

Um olhar curioso e paralelo diante da vivência prévia dentro de um hospital psiquiátrico ao acompanhar pacientes hospitalizados andando por corredores sem rumo e ausência de atividades para preencher o dia. Foi em um cenário ambíguo que fomos inseridos em que os usuários tem autonomia para exercer sua arte, ser quem são, sem repressão ou regras rígidas. Um aspecto interessante foi o acolhimento que tivemos e a oportunidade de conhecer como funciona um CAPS desde a parte administrativa, farmácia, refeitório, sala de descanso para os usuários e sala que é utilizada para ambulatório e acolhimento através de um triagem na tentativa de compreender o estilo de vida, o processo saúde doença e traçar abordagens para a inserção dentro da unidade.

Em uma das ações realizadas diante da programação semanal houve o grupo de “Ouvidores de Vozes”, o qual não tinha conhecimento prévio e fiquei instigado em entender como era a dinâmica. Dada a hora de início em uma pequena sala acompanhei todo o descarrilhar do momento. Com a participação de cerca de oito participantes mais a psicóloga houve um momento de diálogo prévio sobre como foram as festividades de fim de ano e cada um relatou tal qual sua maneira. Alguns com familiares, filhos e outros de maneira solitária. Em seguida, foi entregue uma folha em branco e lápis de escrever e de colorir para cada um e uma missão de escrever ou desenhar aquilo que a mente dizia tendo em vista que os participantes são portadores da patologia esquizofrenia. Entre frases, riscos e rabiscos cada um tentou descrever sua experiência com a experiência peculiar que é ouvir vozes.

Faço desse momento algo reflexivo. Por vezes encarar um paciente que ouve vozes pode ser perturbador ao imaginar o sofrimento mental e com isso diante do imaginário social muitos não contam suas experiências e tem para si como algo anormal, defeituoso e que os envergonha. Tanto que quando não é compreendido acabam sendo afastados do meio social e também familiar o que os fazem duvidar da própria capacidade de exercer a autonomia.

Após breve conversas foi perguntado para cada um a experiência de ouvir vozes e tentativa de descrever como elas são, o que fazem para acalmar, não obedecer aos comandos que por vezes são lesivos. O interessante foi a diversidade de respostas. Um dizia sobre a necessidade de mudar de visual e por isso mudava a barba, outra usuária descrevia sobre uma voz que mandava se manter afastada dos entes queridos. Porém, uma descrição me chamou a atenção. Um usuário desenhou círculos ao redor da página e um central e disse que sua experiência em ouvir vozes se dava em vários “eus” como uma sala de espelhos e ele no centro e a todo momento mandavam cortar os pulsos. Quando esses momentos ocorriam a estratégia adotada era fechar os olhos ou se afastar e deitar até o grau de vozes diminuir. Mas como reconhece que não é bom tomar tal atitude não obedece.

Ouvir vozes da própria mente cada um de um jeito diferente e relatar como se sentem cria um sentimento de unidade e a certeza de que não estão sozinhos durante esse processo de recuperação e acompanhamento. Diferentemente da desassistência para pessoas que ouvem vozes dentro do Hospital Escola Portugal Ramalho em que não há momentos como esse de acompanhamento.

Também vale ressaltar o comprometimento dos profissionais e o papel da interdisciplinaridade entre os profissionais. Uma anamnese não necessariamente é feita por um médico e sim por uma nutricionista ou enfermeira ou até uma terapeuta ocupacional. Momento para descansar em um espaço confortável, aula de zumba, música e artesanato ajudam a desenvolver habilidades que por vezes não seriam estimuladas em casa ou até mesmo em um hospital psiquiátrico.

O desenvolvimento de um olhar mais crítico e surpreendente findou a experiência de forma positiva com o desejo que haja mais investimentos em CAPS e ausência de um hospital psiquiátrico no modelo que infelizmente ainda existe aqui em Maceió – Alagoas.

Deixo meu carinho e desejo de melhoras ao usuários do CAPS que convivi durante o estágio pois foi muito legal a oportunidade de fazer amizade com eles e receber em troca atenção.

#Texto produzido com base nas experiências em conjunto pelos estagiários do curso de medicina da UFAL

Bruna Campelo; Nina Beatriz; Ranulfo Paranhos e Sophya Bezerra.