Morreu Saramago

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“No dia seguinte ninguém morreu”. Assim começa o livro “As Intermitências da Morte” de José Saramago. Queria poder dizer agora que Saramago não morreu e que em breve lançará um novo livro.

 

Hoje pela manhã ao navegar pela Internet me deparei com a notícia da morte de Saramago de quem li poucos mas essenciais livros. Veio-me a memória o “Evangelho Segundo Jesus Cristo”, “Jangada de Pedra”, “Ensaio sobre a Cegueira” e “As Intermitências da Morte”. Ao mesmo tempo, deparei-me novamete como a imprensa é desrespeitosa com a morte, seja de famosos, seja de pessoas simples.

 

A única coisa perceptível nas notícias é que a vida de Saramago ficaria restrita a uma lista de livros com foco na curiosidade mórbida sobre o que o teria vitimado (Coração? Problemas respiratórios?). Saramago na literatura é um martelo no pensamento conservador, em tudo aquilo que ele tem de pernicioso, principalmente neste falso discurso de produção da bondade e de que a crença num Deus qualquer é o passaporte para sermos “bonzinhos”. Os casos de pedofilia no clero católico é apenas um indício “tímido” dessa falácia enquanto princípio absoluto. Ao ler os seus livros fica o ímpeto de decretar a destruição da mortificação do corpo e a liberdade de crescimernto da alma enquanto intelecto crítico e criador.

 

Saramago é antes de tudo o enaltecimento do humano. E o ápice desse enaltecimento está em seu “deus” em o “Evangelho segundo Jesus Cristo”, que ressalta a dor, o sofrimento, a vulnerabilidade, o prazer e o desejo sexual num Cristo de carne e osso. Ali descobrimos talvez um novo sentido no Evangelho de João quando percebemos que, de fato, o Cristo está em nós todas as vezes que nos alegramos com o prazer, sofremos com a dor e lutamos contra as injustiças, fundamentalmente porque ele seria tão humano quanto eu ou você.

 

O mundo fica mais pobre sem Saramago. Mas agora, como ressaltou Marcos Pires em email, após essa perda ainda resta o consolo “…pela grandeza de uma vida que se encerra neste tempo horizontal em que insistimos em viver. Porém, ele agora se afasta do espaço tempo linear para estar nas alturas do tempo vertical mais denso e de uma infinitude mais sublime”.