Homofobia e Inclusão

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Você deixaria de dar um emprego para uma pessoa por conta da sua preferência sexual?

Você chamaria a polícia caso um casal homossexual se beijasse no restaurante onde voce estivesse comendo?

Você tentaria fazer com que um colega de trabalho atendesse um pessoa homossexual porque você não consegue lidar bem com gays, mesmo que essa pessoa tivesse que esperar além do tempo necessário?

Você promoveria um abaixo assinado na escola de seu filho para demitir ou transferir uma professora que fosse homossexual?

Ou então, caso alugasse um imóvel,  entre duas pessoas interessadas, você não alugaria sua propriedade para uma pessoa homossexual?

Bem, caso você se identifique com respostas que promovam a discriminação de pessoas por conta de sua orientação sexual, tome cuidado. Em breve essa postura poderá ser tipificada como crime. Está em tramitação projeto de lei que criminaliza a prática da homofobia.

 

Isso tem incomodado muita gente. Aliás, um dos traços da cultura machista, além da promoção da violência contra a mulher, é justamente a naturalização de todas as formas de violência contra pessoas homossexuais. Crescemos ouvindo expressões pejorativas: "Bicha", "Veado", "Maricas". Essas expressões sempre foram utilizadas como desabonadoras.  É  natural que qualquer mudança legislativa gere resistências, afinal, essas mudanças visam regulamentar comportamentos e atitudes enraizadas. Cumprem assim um certo caráter pedagógico pois funcionam como balizadores sociais, sinalizando aos cidadãos o que é "correto" e o que é "errado".

 

Mas o que me motivou a escrever este post foi perceber que com o passar dos meses e com a aproximação da votação final no senado, muitos grupos organizados tem se manifestado contra a lei, em particular os grupos evangélicos na figura da liderança de proeminentes pastores. O argumento central que defendem é o seguinte: com a aprovação da lei os pastores não poderão mais exercer o direito constitucional de livre expressão na medida em que qualquer posição crítica com relação a prática homoafetiva seria automaticamente rotulada como crime. Asssim, cenas triviais de pastores brandindo suas bíblias dizendo que a homossexualidade é pecado, não poderia mais acontecer porque iria ferir a lei da homofobia.

Algumas falas são, digamos, mais paranoides. Denunciam uma conspiração gay que estaria invadindo os meios de comunicação de massa insinuando que ser gay é legal e bonito. Filmes e novelas estariam incitando a prática da homossexualidade e assim colocando em risco nossa pobre juventude já exposta a outros tantos  vícios etc etc.

Acho triste esta linha argumentativa. Ela faz um silêncio ruidoso sobre o que anda acontecendo com pessoas homossexuais, vítimas de toda a forma de preconceito e violência. Basta que façamos um simples movimento de abrir um jornal, ligar a TV ou usar um mecanismo de busca na internet para sabermos dos muilhares de atos de barbárie pulverizados pelo cotidiano sem que as pessoas se dêem conta que estes atos, aléwm de inaceitáveis, em parte  não são regulados como atos infracionais contra a dignidade humana.  Os casos de violência explíciita são enquadrados nos artigos do código penal. maso que dizer da pessoa que perde seu emprego pelo fato de ter conduta homoafetiva? Até quando as pessoas irão achar isso uma coisa normal?

A nova regulamentação que criminaliza a homofobia quer em última instância incluir o ato discriminatório contra homossexuais da mesma forma que pessoas hoje em dia não possam ser mais discriminadas pela cor de sua pele,pela sua religião, pelo seu gênero, pela sua procedência geográfica. Significa um avanço importante em termos das políticas inclusivas e de promoção da cidadania. Para nós que trabalhamos com a humanização das práticas de saúde deve ser visto como uma vitória pois assinala que a lei vê esse grupo de pessoas como seres humanos plenos, dotados de direitos inalienáveis e, assim, efetivando uma forma de inclusão legal de suas atitudes e necessidades pessoais e coletivas.

 

Os pastores e padres, em nome da pureza de seus propósitos, querem se sentir livres para continuarem a propagar que a homossexualidade é pecado e que não deveria ser praticada. Nada na letra da lei os impedirá de fazer isso. O que a lei irá impedir e punir, caso seja transgredida,  é que uma pessoa homossexual seja expulsa do recinto de uma igreja por conta de sua orientação sexual. Da mesma forma, pastores e fieis deverão ter que conviver no espaço público com a diferença e a diversidade, seja num teatro, num cinema, na praia ou num restaurante. Isso não é corrupção de costumes, é apenas a demonstração de civilidade. Se heterossexuais podem expressar sua afetividade em público, por que os homossexuais não poderiam também faze-lo? Afinal, são tratados de forma igualitária quando pagam impostos!

 

Mas tudo bem, para que pastores possam continuar a propagar sua visão de mundo,  lutemos contra lei. Para que eles citem infinitamente suas passagens bíblicas, fechemos os olhos quando pessoas homossexuais não podem alugar imóveis por conta de sua orientação sexual. Para que os pastores sintam-se livres para pregarem que homossexuais irão ao inferno, não nos incomodemos com o fato de um casal gay ser expulso de um restaurante pelo simples fato de entrarem ali de mãos dadas. Toda a institucionalização do preconceito é permitida para que do alto de seus púlpitos as pessoas possam dizer que o preconceito é um ato que deriva diretamente do divino!

 

Para que as pessoas possam ter um posicionamento com base no conhecimento, transcrevo a lei em discussão. Qualquer olhar mais isento perceberá logo que o problema não é o medo de ter a liberdade de expressão tolhida ao se posicionar contra a prática da homossexualidade por razões religiosas. O medo é o de conviver com a diferença!

 

 

 
"O Congresso Nacional decreta:
 
Art. 1º. A qualquer pessoa jurídica que por seus agentes, empregados, dirigentes, propaganda ou qualquer outro meio, promoverem, permitirem ou concorrerem para a discriminação de pessoas em virtude de sua orientação sexual serão aplicadas as sanções previstas nesta Lei, sem prejuízo de outras de natureza civil ou penal.
 
Divulgação/Agência Câmara
 
Autora do projeto contra homofobia, deputada Iara Bernardi vai participar de parada em SP
Art. 2º. Para os efeitos desta Lei são atos de discriminação impor às pessoas, de qualquer orientação sexual, e em face desta, as seguintes situações:
 
I – constrangimento ou exposição ao ridículo;
 
II – proibição de ingresso ou permanência;
 
III – atendimento diferenciado ou selecionado;
 
IV – preterimento quando da ocupação de instalações em hotéis ou similares, ou a imposição de pagamento de mais de uma unidade;
 
V – preterimento em aluguel ou locação de qualquer natureza ou aquisição de imóveis para fins residenciais, comerciais ou de lazer;
 
VI – preterimento em exame, seleção ou entrevista para ingresso em emprego;
 
VII – preterimento em relação a outros consumidores que se encontrem em idêntica situação;
 
VIII – adoção de atos de coação, ameaça ou violência.
 
Art. 3º. A infração aos preceitos desta Lei sujeitará o infrator às seguintes sanções:
 
I – inabilitação para contratos com órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional;
 
II – acesso a créditos concedidos pelo Poder Público e suas instituições financeiras, ou a programas de incentivo ao desenvolvimento por estes instituídos ou mantidos;
 
III – isenções, remissões, anistias ou quaisquer benefícios de natureza tributária.
 
Parágrafo Único: Em qualquer caso, o prazo de inabilitação será de doze meses contados da data de aplicação da sanção.
 
Art. 4º. O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de 90 (noventa) dias.
 
Art. 6º. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
 
Justificação
 
A sociedade brasileira tem avançado bastante. O direito e a legislação não podem ficar estagnados. E, como legisladores, temos o dever de encontrar mecanismos que assegurem os direitos humanos, a dignidade e a cidadania das pessoas, independente da raça, cor, religião, opinião política, sexo ou da orientação sexual.
 
A orientação sexual é direito personalíssimo, atributo inerente e inegável a pessoa humana. E como direito fundamental, surge o prolongamento dos direitos da personalidade, como direitos imprescindíveis para a construção de uma sociedade que se quer livre, justa e igualitária. Não trata-se aqui de defender o que é certo ou errado. Trata-se de respeitar as diferenças e assegurar a todos o direito de cidadania.
 
Temos como responsabilidade a elaboração leis que levem em conta a diversidade população brasileira. Nossa principal função como parlamentares é assegurar direitos, independente de nossas escolhas ou valores pessoais. Temos que discutir e assegurar direitos humanos sem hierarquizá-los. Homens, mulheres, portadores de deficiência, homossexuais, negros/negras, crianças e adolescente são sujeitos sociais, portanto sujeitos de direitos.
 
O que estamos propondo é fim da discriminação de pessoas que pagam impostos como todos nós. É a da garantia de que não serão molestados em seus direitos de cidadania. E para que prevaleça o art. 5º da nossa Constituição: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade."
 
A presente proposição caminha no sentido de colocar o Brasil num patamar contemporâneo de respeito aos direitos humanos e da cidadania. E é por esta razão que esperamos contar com o apoio das nobres e dos nobres colegas para a aprovação deste projeto de lei.
 
Sala das sessões, em 07 de Agosto de 2001.
 
Deputada IARA BERNARDI (PT-SP)"