A medicalização é tema de saúde pública! Medicar sim, Medicalizar não!

18 votos

15cns.jpg

A XV° Conferência Nacional de Saúde, com o tema “Saúde Pública de Qualidade para Cuidar Bem das Pessoas: Direito do Povo Brasileiro”, ocorrerá entre os dias 1 e 4 de Dezembro deste ano, mas até chegar lá muitas discussões acontecerão nas pré-conferências municipais e estaduais.

Nós, do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade,  conclamamos os usuários do SUS e profissionais da Saúde a pautarem e discutirem nas etapas municipais, estaduais, distrital e federal um tema de suma importância, o da medicalização da sociedade.

Aliás, o que é medicalização da sociedade?

Medicalização é o processo que converte questões não médicas, em  problemas médicos. Não implica necessariamente no uso excessivo de medicamentos, ainda que essa possa ser uma de suas facetas. Sua característica fundamental consiste na  transformação de problemas de ordem social ou processos afetivos e culturais em doenças de ordem biológica, como transtornos e distúrbios, operando um reducionismo.

“Disforia pré-menstrual”, “Síndrome das pernas inquietas”, patologização da identidade trans, medicalização das relações homoafetivas, a lista é comprida, o que demonstra a relevância do tema. E que se torna ainda mais alarmante na medida em que a aprendizagem e os modos de ser e agir têm sido alvos preferenciais da medicalização.

Com isso, problemas que surgem na escola acabam sendo tratados como se fosse uma doença localizada no aluno . Os exemplos são vários, “Transtorno do Déficit de Atenção”, o “Distúrbio do Processamento Auditivo Central”,, a “Hiperatividade”, a “Dislexia”, a “Discalculia”, a “Disgrafia”, o “Transtorno Opositor Desafiante”…

Ao se fazer isso desconsidera-se a complexidade de fatores que levam às dificuldades de aprendizagem e de comportamento dos alunos e acaba-se por responsabilizar o próprio aluno.

No âmbito do SUS, a medicalização é um tema que precisa ser enfrentado. O SUS tem em suas diretrizes o atendimento integral, em que o usuário deve ser reconhecido em  todas as dimensões que o constituem como sujeito, com os diferentes determinantes que o afetam no seu processo-saúde doença.   Traz um olhar multiprofissional às demandas do sujeito, remetendo ao atendimento integral e não mais ao modelo médico-sintoma. No entanto,    muitos CAPSis, Centro de Atendimento Psicossocial Infantil, ficam lotados com demandas para acolhimento desses supostos transtornos da aprendizagem. Os serviços de saúde, ao invés de trabalharem em conjunto com os serviços de educação e de assistência, muitas vezes, encaminham os alunos que não se adequam aos modos de avaliação das escolas aos CAPSis, impedindo que crianças com problemas psiquiátricos graves possam ser atendidas. Mesmos estas crianças, tão estigmatizadas em suas diferenças, acabam tendo o seu território reduzido nestes CAPSs, a visão medicalizada impede  que estas crianças circulem em seus territórios, entre os diferentes equipamentos, CECCOs, UBSs, dispositivos sociais, esportivos, culturais, até que ponto não estamos mantendo um modelo hospitalocêntrico de atendimento.  

E não é por acaso que o Metilfenidato, psicofármaco mais indicado para o tratamento de problemas de aprendizagem, como o TDAH (Transtorno do Déficit de Antenção com Hiperatividade), aumentou suas vendas em 1200% em 4 anos na rede privada.

O Metilfenidato também é dispensado na rede pública, e no Estado de São Paulo, em levantamento realizado em 257 municípios, a dispensação saltou de 227.420 comprimidos em 2007 para 946.599 comprimidos em 2010, ou seja , um aumento de 417%.

O que se descobriu é que a prescrição desse tipo de medicamento ocorre de forma indiscriminada em muitos serviços de atenção à saúde, e é por isso que alguns municípios como Campinas e São Paulo possuem protocolos para que a dispensação seja feita de forma adequada e com o acompanhamento multiprofissional, garantindo a atenção integral do usuário do SUS.

A garantia ao acesso e atenção de qualidade no SUS é um direito, e por isso a discussão da forma correta do acolhimento das questões geradas na escola e da prescrição e dispensação de psicofármacos precisa entrar em pauta.

Vamos juntos pautar uma política nacional para a correta dispensação de psicofármacos?

Venha com a gente construir um SUS que cuide das pessoas e não somente que trate todos como doentes em potencial.