Dia da Visibilidade Trans – para além do respeito, o necessário acolhimento e a interseccionalidade
No Dia 29 de Janeiro é comemorado o Dia da Visibilidade Trans.
Comemoração?
Até o dia de hoje (28/01) 56 mulheres trans foram assassinadas. Preferiria o nosso pensamento cartesiano, aquele que pensa em formas retas e ‘perfeitas’, que se fossem mais duas – 58 mortas – poderíamos dizer que até o dia 29 de Janeiro, no Dia da Visibilidade Trans, foram 2 Mulheres Trans assassindas por dia.
Aí ficaríamos com números redondos para então lamentar o assassinato de DUAS mulheres trans por dia nesse ano que acaba de iniciar.
Mas essa conta não é redonda, ela não cabe no nosso pensamento cartesiano onde gênero se cola a uma parte do corpo, assim como a sexualidade também. Aliás, o vício do nosso pensamento é esse, achar que tudo tem que estar em um lado de um campo de futebol. A vida pode até ser um jogo, mas vamos combinar, as regras são mais complexas.
A questão da Transexualidade é um pouco mais complexa para o público leigo – inclusive Lésbicas e Gays -, porque não está associada diretamente à sexualidade. Apesar de estar dentro da sigla LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) Identidade de Gênero e Sexualidade são coisas distintas, há Mulheres Trans que namoram e casam com Mulheres, assim como Homens Trans que namoram e casam com Homens, assim como há Homens Trans que namoram e casam com Mulheres Trans. Entenda, se o seu irmão ou amigo começar a namorar uma mulher trans ele não ‘virou’ gay, ele virou o namorado de uma mulher. Ponto final <3
Então é isso, vamos apagar nossos preconceitos e achismos sobre sexualidade quando vamos nos referir à população trans?
Gênero e sexualidade são coisas diferentes.
Vale a pena ilustrar um pouco:
E é por isso que o SUS tem dentro da sua produção técnico-política a POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE INTEGRAL DE LÉSBICAS, GAYS, BISSEXUAIS, TRAVESTIS E TRANSEXUAIS. E logo no início esse documento já diz:
A Política Nacional de Saúde LGBT é um divisor de águas para as políticas públicas de saúde no Brasil e um marco histórico de reconhecimento das demandas desta população em condição de vulnerabilidade
É importante que qualquer gestor ou ativista do SUS entenda a gravidade da vulnerabilidade com que as transexuais e os transexuais se encontram, além dos assassinatos quase sempre envoltos com requintes de crueldade, a população trans é presente em diversos serviços de saúde mental, de drogadição e de atendimento à população em situação de rua com histórias de vida repletas de recorrentes estigmatizações e preconceito. Se em um único ano já tivemos 28 dias com 58 assassinatos por transfobia, quantos outros tipos de violências as e os transexuais não sofreram só esse ano?
No dia 27 de Janeiro, para marcar esse necessário engajamento dos trabalhadores e gestores do SUS com a causa, foi lançada a Campanha de Saúde Integral para a População Trans (o site oficial você acessa aqui).
Mas para além da campanha, precisamos potencializar o papel do SUS como prática integrativa de saúde comunitária, do contrário vamos só reiterar um dia de conscientização e uma política centrada em uma população chave sem potencializar a ponta do serviço – o posto de saúde, a UBS – como espaço para cidadania. Afinal, para além da capacitação dos profissionais também é necessário sensibilizar os usuários SUS para as demandas desse população.
Quantas mulheres transexuais você acolhe no seu serviço sem encaminhar direto para um CRT-DST-AIDS? Ela quer ser testada ou quer simplesmente um acolhimento integral?
Quantos homens trans você está pronto para acolher na consulta de enfermagem ginecológica?
Quantos trans você está disposto a acolher nos serviços de saúde mental e de atendimento à população em situação de rua sem patologizar e medicalizar ainda mais a situação e a história de vida dessa população?
Com quantos trabalhadores, do guarda ao gestor, você está disposto a capacitar para o respeito e cumprimeto da Portaria 1820/2009 que garante o uso do nome social?
A luta contra a transfobia é todo o dia, e ela precisa ser lembrada em diferentes momentos, em diferentes serviços e interseccionado com outros temas, como raça e classe social. Aliás, se um homem trans negro entrasse no seu serviço você agiria de modo diferente se fosse uma mulher trans branca? É necessário relembrar que questão do gênero é sempre marcado pela interseccionalidade.
Deixo aqui como reflexão para marcar o Dia da Visibilidade Trans – quase que como um chamado para a luta nos outros 364 dias – a fala de Leonardo Peçanha, Homens Trans e negro, que revela a pervesão da transfobia e do racismo.
Por Emilia Alves de Sousa
Oi Ruy,
Que bom trazer essa discussão sobre esse tema tão importante!
O número de assassinatos de mulheres trans neste ano, que mal se inicia, é assustador, e além da nossa indignação, nos desafia a apoiar esse movimento em defesa do respeito e acolhida das pessoas trans.
Infelizmente, de acordo com uma pesquisa revelada em março de 2015, o nosso Estado, Piauí, assume o segundo lugar no ranque nacional, de estado com o maior índice de registros de casos de homofobia. Uma realidade que muito nos envergonha e que precisamos revertê-la.
No dia 29 próximo, será lançada pelo governo do nosso estado, a campanha estadual de enfrentamento à transfobia, com o tema: “Não precisa ser Trans para lutar contra a Transfobia”. E vamos à luta!
Abraços!
Emília