Com um toque, você descobre – Chegou a Hora H da Hanseníase

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Apresentação

Trata-se de um projeto de intervenção para diagnóstico precoce de Hanseníase na comunidade de Mangabeira, município de Macaíba-RN, realizado pelos doutorandos do curso de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Alyson Halley Melo Monteiro de Costa e Priscilla Melo de Oliveira Lima, sob tutoria da Profª Vyna Maria Leite e preceptoria de Dr. Yuri Guilherme e Enfa Nayara Buccos, na UBS de Mangabeira – Macaíba-RN, Grande Natal.

Introdução

A Hanseníase é uma doença infecto-contagiosa, crônica, curável, de grande importância de saúde pública devido à sua magnitude e ao seu alto poder incapacitante, atingindo principalmente a faixa etária economicamente ativa.
O Mycobacterium leprae (bacilo de Hansen), o agente etiológico dessa doença, é um microorganismo de alta infectividade, porém baixa patogenicidade, considerado um bacilo álcool-ácido resistete (BAAR), parasita celular obrigatório com predileção pelas células do sistema reticuloendotelial, especialmente os histiócitos do sistema nervoso periférico (célula de Schwann), células da pele e mucosa nasal.
Devido ao padrão de multiplicação do bacilo, a doença progride lentamente. Entre o contato com a pessoa doente e o aparecimento dos primeiros sinais pode levar em média 2 a 5 anos. Depois de sua entrada no organismo, não ocorrendo a sua destruição, o bacilo de Hansen irá se localizar na célula de Schwann e na pele. Sua disseminação para outros tecidos (linfonodos, olhos, testículos, fígado) pode ocorrer nas formas mais graves da doença, nas quais o agente infectante não encontra resistência contra a sua multiplicação. O alto potencial incapacitante da hanseníase está diretamente relacionado à capacidade de penetração do Mycobacterium leprae na célula nervosa e seu poder imunogênico.
O homem é considerado a única fonte de infecção da hanseníase. A transmissão se dá por meio de uma pessoa doente (forma infectante da doença – MB), sem tratamento, que elimina o bacilo para o meio exterior infectando outras pessoas suscetíveis. A principal via de eliminação do bacilo pelo doente e a mais provável via de entrada deste no organismo são as vias aéreas superiores (mucosa nasal e orofaringe), através de contato íntimo e prolongado, muito freqüente na convivência domiciliar. Por isso, o domicílio é apontado como importante espaço de transmissão da doença.
É uma doença que acomete pele e nervos, de fácil diagnóstico, porém o estigma e a falta de conhecimento sobre a mesma, tanto pela população como pelos profissionais de saúde, fazem com que na maioria das vezes o diagnóstico seja tardio, já estando o individuo com incapacidades físicas. Por sua vez, o diagnóstico precoce e o reconhecimento imediato dos quadros reacionais garantem a interrupção da cadeia de transmissão e a prevenção das incapacidades físicas.
Classicamente, o acometimento cutâneo caracteriza-se por máculas hipocrômicas, hipo ou anestésicas. Entretanto, na dependência da forma clínica, placas, nódulos, tubérculos e mesmo infiltração sem lesões de pele aparentes podem ser observados. Com a evolução da doença não tratada, as manifestações dermatológicas e neurológicas associam-se a deformidades e mutilações, alterações que tanto estigmatizam o paciente.
A Hanseníase ainda constitui um problema de saúde pública no Brasil, o que exige um plano de aceleração e de intensificação das ações de eliminação e de vigilância resolutiva e contínua com o objetivo de cumprir o compromisso de eliminar a hanseníase do país, firmado com a Organização Mundial de Saúde desde 1991. Para tanto, tem-se desenvolvido uma série de iniciativas, como a promoção do acesso ao diagnóstico e tratamento gratuito, além da redução do estigma. Isso facilita a detecção precoce da hanseníase, diminuindo, assim, as chances de se desenvolver formas mais graves da doença. Está havendo também a aceitação da idéia de integrar os serviços de controle de hanseníase aos serviços gerais de atenção à saúde, o que está sendo implementado como política na maioria dos países endêmicos. O nosso país continua sendo o segundo país em número de casos no mundo, perdendo apenas para a Índia.
Segundo os dados do Ministério da Saúde entre 1995 e 2007, o Rio Grande do Norte esteve entre os estados em que houve aumento da taxa de detecção de hanseníase nesse período. Em Macaíba, no ano de 2005 foram registrados 02 casos de hanseníase, em 2006 mais 03 casos, em 2007, 02 casos. No ano de 2010, mais 02 casos novos tiveram notificação e no ano de 2011, 05 casos. Totalizando, ao longo de 06 anos completo, 14 casos de hanseníase no município. A UBS de Mangabeira não notificou, ao longo desses anos, nenhum caso de hanseníase.
A hanseníase é uma doença de notificação compulsória em todo território nacional e é de investigação obrigatória. 

Justificativa

A necessidade de intervenção surge perante a divergência entre a panorâmica da endemicidade da hanseníase e a ausência de notificação de casos na UBS de Mangabeira nos últimos anos.
Inseridos no cotidiano da equipe de saúde, pôde-se perceber que a ausência de notificações talvez não refletisse o retrato real epidemiológico local e, atentos ao fato de que o diagnóstico precoce constitui o elo para interromper a cadeia de transmissão e evitar as deformidades da doença, identificou-se que uma ação de busca ativa de casos na região se fazia de extrema importância.

Objetivos Gerais

O objetivo geral do projeto é realizar uma busca ativa intensificada para diagnóstico precoce de hanseníase na comunidade de Mangabeira – Macaíba-RN.

Objetivos Específicos

Identificar casos suspeitos de Hanseníase através do exame dermatoneurológico dos pacientes que buscarem atendimento durante a realização do projeto; Capacitar a equipe de saúde para a abordagem da Hanseníase na Atenção Primária; Notificar os casos suspeitos; Promover educação em saúde a cada paciente atendido; Produzir dados estatísticos referentes à Hanseníase.

Metodologia

O início da ação foi marcado por uma capacitação sobre hanseníase para toda a equipe de saúde da UBS – Mangabeira realizada pelos doutorandos, com o objetivo de atentá-la à suspeição diagnóstica desse agravo, de forma que estivesse apta para identificar sinais e sintomas em pessoas atendidas na unidade de saúde, na demanda espontânea, na comunidade em geral ou em grupos específicos. Um outro ponto explorado durante esse momento foi o da notificação compulsória dos agravos à saúde, na qual se expôs a importância da notificação de qualquer caso suspeito de hanseníase.
A partir de então, criou-se estratégias para mobilizar o maior contingente populacional da área adstrita para atendimento em três dias, nos três pontos de atendimento da comunidade: na comunidade do Shalom, na própria UBS-Mangabeira e na UBS-Guarapes. A divulgação ocorreu através de carro de som, de cartazes na UBS e de divulgação pelos agentes de saúde. Todas as pessoas com alguma mancha na pele deveriam procurar os pontos de atendimento da ação para a realização dos testes de sensibilidade para diagnóstico de hanseníase.

Resultados e Discussão

O projeto “Com um toque, você descobre” reacendeu a abordagem humanizada e integrada que o portador de Hanseníase deve receber pela equipe de saúde, para que, logo no primeiro contato se possa diminuir as barreiras do estigma, do preconceito e do sofrimento enfrentados pelos pacientes, bem como discutir detalhes da doença e o papel da equipe na sua visão não só técnica, mas, humanitária.
“Com um toque, você descobre” mostrou que a principal medida de prevenção da hanseníase está na busca ativa, detecção e tratamento precoce do portador de hanseníase, acompanhada de exame dos contatos intra-domiciliares, vacinação BCG para os contatos e de mobilização social e educação dirigida à população, comunidade e aos profissionais de saúde.
Durante a ação, foram atendidos 92 pacientes e feita 01 visita domiciliar. Em cada paciente foi realizado o exame dermatoneurológico, com avaliação da sensibilidade da área da lesão de pele com o estesiômetro (monofilamentos), tubos de água fria/água quente (sensibilidade térmica), e ponta de alfinete (sensibilidade dolorosa); e palpação dos principais troncos nervosos.
O momento da consulta foi oportunidade também de educação em saúde, com entrega de folhetos informativos sobre a hanseníase e espaço para esclarecimentos/dúvidas sobre a doença.
Ao final da ação, tivemos um número de 02 casos suspeitos de hanseníase (2,17% do total), 01 do sexo feminino, 58 anos e 01 do sexo masculino, 42 anos, dos quais 01 já seguiu o
fluxo de notificação e esclarecimento diagnóstico/tratamento, o outro ainda aguarda atendimento médico na UBS.
A necessidade de se fazer uma visita domiciliar durante o projeto se deu porque havia o conhecimento de um caso confirmado de hanseníase na comunidade do Guarapes, sem notificação pela equipe de saúde e sem seguimento local ou exame dos contactantes. Tratava-se de um caso de hanseníase virchowiana, em tratamento e acompanhamento pelo Hospital Giselda Trigueiro (referência estadual em infectologia), e dois contatos domiciliares, que nunca se submeteram a exame dermatoneurológico ou a nenhuma ação de prevenção ao agravo. Nessa ocasião, os contactantes não estavam presentes, mas todas as orientações foram dadas, tanto para o paciente quanto para a equipe de saúde, no que compete a necessidade das ações preventivas para essa família.
“Chegou a Hora H da Hanseníase” e é competência da Atenção Primária o desenvolvimento da maioria das atividades em relação a essa doença, tendo a Unidade Básica de Saúde a responsabilidade da suspeição diagnóstica, do diagnóstico, da investigação epidemiológica e da realização do tratamento integral do doente.
A idéia é que o mesmo toque que descobriu a anestesia hansênica seja o toque de sensibilidade que falta para o acolhimento humanescente desses doentes. Um único toque, que diagnostica, mas também acolhe.