Relato de Experiência – CAPS Rostan Silvestre

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Myllena Vitória Bispo Santana, interna de medicina pela Universidade Federal de Alagoas durante o estágio em Saúde Mental.

Entre os anos de 1903 e 1967, no Brasil, o tratamento para aqueles considerados fora das funções psíquicas consideradas normais era dado de forma totalmente excludente da sociedade, os retirando do convívio social e os recolhendo a estabelecimentos de “alienados”, como designado por lei. Tendo base na discussão sobre saúde  explicada por aspectos biológicos, étnicos, políticos e ideológicos, tendo base na Psiquiatria Alemã e iniciando um novo momento da psiquiatria no Brasil. Persistindo essa ideia por  anos, entre 1964 e 1974, houve o fortalecimento do modelo hospitalocêntrico na psiquiatria que ficou conhecido como “indústria da loucura”.

Com o processo de abertura política durante o final da década de 70, voltou-se a discutir sobre mudanças no cuidado à saúde mental e o 1978 marcou o início do movimento social pelos direitos dos pacientes psiquiátricos no Brasil, conhecido como Luta Antimanicomial. Nesse período foram várias as denúncias em relação a violência que ocorria dentro dos manicômios e as situações desumanas em que os internados viviam. As mudanças buscadas por esse movimento foram discutidas na 8ª Conferência Nacional de Saúde, momento também em que foi posto em pauta a garantia da saúde como direito de todos e dever do Estado, mais tarde inscrita na Constituição Federal de 1988. Assim, a saúde garantida pela CF e a luta antimanicomial conseguiram a implicação de ações políticas e sociais que fizeram a Política de Saúde Mental mais forte e a busca pela extinção progressiva dos manicômios.

Nesse sentido, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) representam um marco significativo na história da saúde mental, transformando o paradigma de tratamento de transtornos psiquiátricos e emocionais. Surgiram no Brasil na década de 1990 como uma resposta à desospitalização psiquiátrica, visando promover a reinserção social e a recuperação de pessoas com sofrimento mental. A importância dos CAPS reside na sua abordagem humanizada e multiprofissional, que busca compreender o indivíduo em sua totalidade, considerando fatores sociais, familiares e culturais. Além disso, desempenham um papel crucial na redução do estigma associado às doenças mentais, ao proporcionar espaços de acolhimento e apoio. Ao longo dos anos, os CAPS têm contribuído para a melhoria da qualidade de vida de inúmeras pessoas e para a construção de uma sociedade mais inclusiva e consciente da importância da saúde mental.

Os estágios nos CAPS desempenham um papel fundamental na formação de estudantes de medicina, sendo uma oportunidade única de aprendizado prático no campo da saúde mental. Essa experiência possibilita que futuros médicos tenham a chance de compreender de uma forma mais próxima os desafios enfrentados por indivíduos com transtornos mentais, permitindo uma visão holística da saúde. Além disso, os estágios nos CAPS promovem a sensibilização para a importância da abordagem humanizada, da escuta ativa e da empatia no cuidado com pacientes psiquiátricos. Essa formação prática não apenas enriquece a capacidade clínica, mas também contribui para a desconstrução de estigmas relacionados à saúde mental, capacitando-os a desempenhar um papel mais eficaz na promoção do bem-estar psicológico de seus pacientes ao longo de suas carreiras médicas.

 

A experiência prática no CAPS Rostan Silvestre, no município de Maceió, foi muito importante para a desconstrução de estigmas do tratamento manicomial presenciado no hospital da cidade. Foram propiciados vários momentos de troca de conhecimento e histórias com os usuários do CAPS que hoje tomam lugares de liderança na luta antimanicomial. A arte sempre foi vista como um potencial agente de mudança de vida, sendo estimulada por meio de desenhos, pinturas, esculturas e teatro. Presenciar a autonomia que foi dada para todos os pacientes fez quebrar paradigmas e plantar uma semente da mudança em nossa formação profissional.