É preciso garantir a continuidade do Plano de Qualificação das Maternidades e Redes Perinatais

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Confira a entrevista do presidente da Rede de Humanização do Parto e Nascimento (Rehuna) Dr. Marcos Leite dos Santos

O presidente da Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (Rehuna), ginecologista e  obstetra Marcos Leite dos Santos trabalhou no Hospital da Universidade Federal de Santa Catarina desde 1996 e está na  Rede de Humanização do Parto e Nascimento ( Rehuna) desde 1994. Para ele, é fundamental garantir a continuidade do Plano de Qualificação, que dissemina as boas práticas em humanização do parto aos estados que mais precisam.

Qual a importância do plano de qualificação das maternidades?


Na medida em que a imensa maioria das maternidades trabalha com um paradigma completamente ultrapassado e resultados questionáveis no acolhimento e cuidado da gestante e recém nascido, é urgente que o governo federal contribua para a mudança desse eixo. Não é fácil, pois é preciso substituir a maneira de ver a mulher, o parto e nascimento, e a maneira de os profissionais olharem sua própria profissão. Quando o governo propõe essa qualificação das maternidades, é um passo gigantesco. Porém, é preciso garantir a continuidade desse processo, criando inclusive, centros de referência regional para apoiar a continuidade das ações e treinar os profissionais para as boas práticas.

 

O que se pode  considerar como boa prática do parto e nascimento?

 A boa prática tem que estar apoiada no tripé da medicina baseada em evidencias, bioética e o cuidado. A bioética tem alguns preceitos básicos, como não fazer dano, priorizar critérios de justica, etc. e isso é o norte das boas práticas. Hoje, por exemplo,  não se admite fazer uma episiotomia (corte no períneo) sem o consentimento da gestante; isso é uma questão ética, assim como qualquer boa prática. É claro que o que é ético em uma sociedade, não é em outra, então temos o instrumento da medicina baseada em evidencias, para balizar a ética médica.

Com evidências científicas, retiramos as rotinas que não tem comprovada eficácia e introduzimos novas já comprovadas.
A posição da mulher no parto é um bom exemplo. Historicamente, a mulher dá a luz deitada, mas essa é a pior das posições, pois não tem a gravidade a seu favor, faz com que as contrações sejam mais dolorosas e menos eficazes. Por outro lado, o parto vertical, ainda pouco adotado no Brasil,  tem um conjunto de evidencias científicas com muitas vantagens. Na UFSC,  82% dos partos são verticais. Além disso, tudo está à escolha da mulher, e o cuidado envolve essa escuta, os profissionais de saúde devem se colocar no lugar dela e dar uma assistência humanizada.

A boa prática tem que estar apoiada no tripé da medicina baseada em evidencias, bioética e o cuidado. A bioética tem alguns preceitos básicos, como não fazer dano, priorizar critérios de justica, etc. e isso é o norte das boas práticas. Hoje, por exemplo,  não se admite fazer uma episiotomia (corte no períneo) sem o consentimento da gestante; isso é uma questão ética, assim como qualquer boa prática. É claro que o que é ético em uma sociedade, não é em outra, então temos o instrumento da medicina baseada em evidencias, para balizar a ética médica. Com evidências científicas, retiramos as rotinas que não tem comprovada eficácia e introduzimos novas já comprovadas. A posição da mulher no parto é um bom exemplo. Historicamente, a mulher dá a luz deitada, mas essa é a pior das posições, pois não tem a gravidade a seu favor, faz com que as contrações sejam mais dolorosas e menos eficazes. Por outro lado, o parto vertical, ainda pouco adotado no Brasil,  tem um conjunto de evidencias científicas com muitas vantagens. Na UFSC,  82% dos partos são verticais. Além disso, tudo está à escolha da mulher, e o cuidado envolve essa escuta, os profissionais de saúde devem se colocar no lugar dela e dar uma assistência humanizada.

Outro exemplo de práticas rotineiras que são comprovadamente apenas mitos são a necessidade de tricotomia (raspagem dos pelos pubianos) e a  lavagem intestinal. Não há qualquer evidência científica de que essas atitudes melhoram o parto.
Por outro lado, importantes exemplos de boas práticas são o uso restrito da cesariana, pois ela só é necessária quando a vida da mãe e do bebê estão em risco, e nunca deve ultrapassar a taxa de 15%. A introdução de métodos não farmacológicos para alívio da dor, como o uso da água quente, massagem, acupuntura, musicoterapia e aromaterapia também são importantes, bem como garantir a presença do acompanhante, que apesar de estar previsto em legislação, não é garantido por boa parte das maternidades.

 

Como conscientizar gestores, trabalhadores e usuárias da importância das boas práticas?


Quem vai realmente fazer a diferença são as mulheres, as gestantes. À medida em que elas exigem seus direitos, devem brigar por ele. Nós como profissionais de saúde, fazemos aquele trabalho de formiguinha, respeitando o limite dos profissionais, pois ninguém deixa de fazer episiotomia de um dia para o outro. Para se mudar,  é um trabalho de convencimento e observação de resultados, como os que se podem ver claramente em um dos ícones das boas práticas de humanização do parto que é o Hospital Sofia Feldman, em Belo Horizonte – MG.

 

Qual o maior desafio na humanização do parto e nascimento?


O convencimento dos obstetras sobre a necessidade de se mudar esse paradigma. Eles resistem muito, pois o atual modelo médico coloca todos os obstetras em uma área de conforto grande. Veja só a abusiva taxa de cesariana no Brasil. É um procedimento simples, que leva 20 minutos, o médico pode se programar, sem ter que levantar de madrugada, por exemplo, e realizar várias o dia em que quiser, quando quiser. Isso é muito cômodo para a minha classe, a classe médica. Para sair da zona de conforto,  é preciso uma mudança ideológica profunda.