Comunicação – um elo essencial no processo de Humanização Hospitalar

15 votos

O mundo moderno viu crescer o poder da comunicação. Se antes os profissionais da área estavam destinados a atuar em veículos de imprensa ou agências de publicidade, hoje é nítida a valorização deste tipo de profissional em empresas dos mais diversos ramos, desempenhando suas atividades de maneira criativa e sistemática com a finalidade de construir e manter a reputação de organizações em todos os setores de atividade.

O trabalho da equipe de comunicação que atua na área hospitalar vai além, muito além, da simples e corriqueira divulgação externa em busca da promoção da instituição de uma maneira positiva nos mais diversos meios de comunicação (jornais impressos, rádios, televisões, sites de notícias e redes sociais). Também não se restringe ao gerenciamento de crises para evitar ou reduzir os impactos de uma possível repercussão negativa. Vai além da divulgação de novas formas de tratamentos ou terapias para os diversos males que acometem as comunidades.

Para entender a importância da comunicação na área hospitalar, em especial da comunicação como aliada dos processos de humanização, é preciso perceber que a comunicação está ligada a tudo, fortalecendo ou prejudicando o relacionamento que estabelecemos com o mundo, a partir do momento em que abrimos os olhos. Sendo assim, qualquer indivíduo, desde antes mesmode seu nascimento, se comunica – se expressa – de alguma forma. E quando nos expressamos, nossa premissa é de que queremos ser ouvidos, ou percebidos.

São inúmeros os provérbios populares nos mostram a importância do ouvir, a importância de nos livrarmos de conceitos pré-concebidos para poder avaliar uma questão a partir de um novo ponto de vista – e que apontam a comunicação como o principal pilar em que se alicerçam os relacionamentos humanos. Vale destacar que há comunicação em tudo, partindo das palavras ditas e escritas, mas avançando para o espectro dos olhares, das posturas, dos gestos, dos movimentos… A partir da definição prévia de que tudo é comunicação, podemos articular um silogismo simples e assumir que, portanto, humanização é comunicação. E é justamente esta ideia que defende o psicoterapeita Jaime Betts, no artigo Considerações Sobre o que é o Humano e o que é Humanizar, quando afirma que, desde que nasce, a criança é capturada “numa rede de imagens e palavras”. Para ele, “humanizar é garantir à palavra a sua dignidade ética”.

Mas, afinal, como se pode garantir à palavra sua dignidade ética? De acordo com a psicóloga Eliana Ribas, responsável pelo Núcleo Técnico de Humanização Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES), isto se consegue a partir do momento em que nos deixamos contaminar pelo que o outro tem para nos dar. Para isso, é preciso nos despirmos de nossos conceitos pré-concebidos ou julgamentos pré-formados, a fim de podermos absorver e entender o que o outro nos oferece, na integridade do contexto da outra pessoa. “Não podemos avaliar a verdade de um indivíduo a partir da nossa realidade. Só conseguiremos compreendê-lo se avaliarmos a sua verdade a partir da sua realidade”, explica.

Para isso, é preciso aprendermos a nos comunicar, a falar e, também, a ouvir – pois comunicação não é uma via de mão única, mas isto sim, múltipla. É preciso, portanto, nos comunicarmos na integralidade deste ato, buscando entender toda a contextualização além das palavras, absorvendo o que se diz por meio do olhar, da postura e dos movimentos.

Obviamente, o que parece simples de ser explicado é difícil de ser colocado em prática. Isto acontece pelo fato de que as pessoas têm medo daquilo que desconhecem. E, ao se abrirem para a comunicação – e, portanto, para a humanização – será preciso confrontar o desconhecido apresentado pelo outro. Mas é importante perceber, que esta inquietação e desaconchego provocado pelo estranhamento nos permite crescer e nos desenvolver, nos permite evoluir. A partir desta contextualização, podemos perceber que, tratar o próximo com carinho, respeito e atenção não significa ser piedoso, assistencialista ou caridoso. Significa ouvi-lo, verdadeiramente. E ao fazermos isto, embarcamos em uma relação que apenas traz benefícios a todos os envolvidos.

A atuação ou gestão humanizada estimula a integração, cria espaços de participação e valoriza as manifestações que visam o crescimento organizacional. Este modo de ação permite ao gestor transformar as experiências, em ferramentas que ajudam a melhorar os resultados alcançados e atingir as metas almejadas com mais tranquilidade e qualidade de vida para a equipe. Por isso é tão importante saber converter dados em informações, e estas, por sua vez, em conhecimento. Em uma equipe multidisciplinar, aprende-se a ver a mesma realidade – a situação de um paciente – a partir de diversos olhares, ou seja, mais próximo de sua totalidade. E isto irá beneficiar tanto aos profissionais que integram o grupo, como ao paciente em questão e, mais adiante, a outros doentes.

No relacionamento do profissional com quem está sendo cuidado, significa assumir que cada um passará pelas fases do tratamento de uma maneira diferente, porque possuem um histórico de vida diferente. Uns toleram a dor mais que outros. Uns apresentam mais efeitos colaterais que outros. Uns, não aceitam tratamentos que são abraçados prontamente por outros. Mais que julgar, ter compaixão, dó ou piedade, é preciso aceitar e respeitar as diferenças, atuando com profissionalismo e dignidade; atuando com amor ao próximo e à nós mesmos, pelos benefícios que esta relação trará a ambos.

Promover a Humanização envolve uma mudança – para melhor e bastante significativa – na qualidade das relações entre as pessoas, é fato. Mas também reflete uma transformação cultural em diferentes aspectos da organização, tanto no que diz respeito ao atendimento, quanto nos aspectos relacionados ao cuidado com as instalações e facilitação do acesso. Não devemos nos esquecer da importância da presteza do atendimento, do aprimoramento das formas de comunicação e dos canais de participação de todas as pessoas envolvidas com a instituição – pacientes, acompanhantes, profissionais, prestadores de serviços ou fornecedores, para citar alguns poucos exemplos. A busca por processos e condutas mais humanizadas não é uma atividade com começo meio e fim. É, isto sim, um processo em constante desenvolvimento e evolução.

Para entender a importância da humanização em saúde, um bom exercício é manter em mente nossas experiências particulares com o processo de adoecimento, para refletir, a cada minuto, sobre o quanto esta experiência é difícil, tanto para aquele que está sendo tratado, quanto para seus familiares e, em alguns casos, até mesmo para os profissionais da saúde.

O desenvolvimento de projetos de humanização pode – e deve – contar com a atuação de uma equipe multidisciplinar, envolvendo profissionais da área de comunicação. A melhor forma de expressar, a melhor ferramenta para interagir, a busca pelo modelo linguístico adotado, são exemplos de contribuições importantes que estes profissionais podem oferecer. Durante minha atuação no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, a participação da comunicação estendia-se para além das reuniões da Subcomissão de Integração e Apoio aos Profissionais (SIAP) e da Subcomissão de Apoio aos Usuários e Relações com a Rede (SAUARE). Por vezes, a presença nestas comissões era o princípio de importantes e duradouras parcerias que levaram ao desenvolvimento de uma centena de projetos focados nas necessidades específicas dos profissionais e pacientes do maior centro oncológico público do país.

Por vezes, a atuação da equipe de comunicação envolvia a criação de marcas, layouts e conteúdos para projetos voltados aos colaboradores e pacientes. Com frequência, sua atuação passava pelo planejamento, criação, coordenação e desenvolvimento de atividades. Pode-se mencionar, por exemplo, atividades como o Café Com Diretor, cujo objetivo era estimular uma conversa matinal da equipe com a diretoria, aproximando-os da alta gestão; a criação e manutenção de um boletim interno semanal, a fim de disseminar informações sobre a própria instituição, além de conteúdo de cultura e lazer; a produção e divulgação dos mais variados comunicados e informativos internos, com o objetivo de socializar a informação e gerar alertas com a máxima eficiência no menor tempo necessário; produção das mais variadas cartilhas e outros materiais voltados à educação e orientação do paciente, como ferramenta de suporte à assistência. A comunicação é, portanto um braço forte para quem deseja humanizar.

É um elo essencial e indissociável daqueles que pretendem humanizar a assistência médico hospitalar.