Ambiência como parte do processo terapêutico em um CAPS III

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Segundo a Política Nacional de Humanização, do Ministério de Saúde, ambiência na saúde compreende o espaço físico, social, profissional e de relações interpessoais que deve estar em sintonia com um projeto de saúde voltado para a atenção acolhedora, resolutiva e humana.

Em consonância a isso, o relato a seguir descreve uma intervenção, através da ambiência, a uma usuária do CAPS III Liberdade, em Aracaju/SE, a qual estava em acolhimento noturno, desde dezembro/2017, por apresentar os sintomas de: mutismo, isolamento social, abulia, vinculados a um quadro psicótico. Inúmeras tentativas de inserção da referida pessoa em atividades ou atendimentos individuais centrados no discurso foram realizadas pela equipe técnica da instituição, entretanto sem conseguir produzir modificação do quadro acima descrito, o qual gerava preocupação, pois este tinha um caráter de isolamento, podendo incidir em uma possível tentativa de suicídio.

No mês de fevereiro/2018, no final de uma festa de carnaval neste dispositivo de saúde, a referida usuária estava deitada em um dormitório do serviço, e após a escuta de uma canção específica colocada pelo autor deste trabalho, foi até o pátio onde estava acontecendo a comemoração carnavalesca e começou a interagir com os outros usuários e trabalhadores por meio da dança, de uma forma totalmente tranquila, alegre e espontânea, ou seja, modificou o quadro “silencioso” que se encontrava. Esse momento perdurou por uns 30 minutos, ininterruptos, e desencadeou nas semanas subsequentes a comunicação fluida da usuária, conseguindo assim expressar seus sentimentos e desejos, culminando na alta do acolhimento noturno.

A partir daí, apreendemos junto a referida mulher que ela sempre gostou de dançar e se divertir, no entanto após uma série de problemas familiares e sociais que estava imersa, adveio inúmeras crises psiquiátricas. Logo após a alta do referido acolhimento a pessoa começou a frequentar o CAPS de forma intensiva, e o decorrer do tempo, com a fluidez e espontaneidade dos seus comportamentos, ficou comparecendo duas vezes na semana, participando de consultas psiquiátricas, oficinas e atividades afins ao seu desejo. Pode-se constatar que o preparo do ambiente, a música e a expressão artística são atividades vinculadas a política nacional de humanização, e dessa forma se mostram como uma tecnologia leve de atenção a população que possui algum sofrimento mental.

Nesse ínterim, verificamos que a ambiência, por meio da música e da organização do espaço físico de um CAPS, revelou-se como instrumento produtor de saúde neste serviço, sobretudo quando as intervenções tradicionais, ancoradas no discurso, não conseguiam gerar vínculo e cuidado.