CAPS ROSTAN: Experiência na luta antimanicomial e liberdade no SUS.

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Experiência no CAPS Rostan vivenciada pelos estudantes do estágio de saúde mental da UFAL (2025): Samara Silva Noronha Cavalcante, Pedro Fellipe Dantas Cordeiro e Leticia Medeiros Mancini.

O serviço nas unidades do CAPS funciona de maneira mais aberta e coletiva do que outros lugares por onde já passei. Lá, o cuidado não se resume à consulta com o psiquiatra ou ao uso da medicação. O foco está no convívio, no acompanhamento diário e no apoio à autonomia dos usuários. Os grupos fazem parte da rotina e ajudam bastante. Tem grupo de conversa, grupo de oficinas com atividades como pintura ou música, e até grupo para familiares. São espaços onde os usuários podem se expressar, trocar ideias e aprender uns com os outros. Isso ajuda a criar uma rotina mais estruturada e a diminuir o isolamento. Outra coisa interessante é a Gestão Autônoma da Medicação, que propõe que os usuários participem das decisões sobre os remédios que tomam. Eles conversam com os profissionais sobre os efeitos, tiram dúvidas e aprendem a perceber o que funciona melhor para si. Isso fortalece a responsabilidade sobre o próprio tratamento. No dia a dia, o CAPS funciona como um ponto de apoio. Os profissionais trabalham em equipe, e o cuidado é compartilhado. É um espaço que oferece escuta, orientação e acompanhamento contínuo, respeitando o ritmo e a realidade de cada pessoa. De modo geral, vejo o CAPS como um serviço que busca manter o cuidado próximo da vida real das pessoas. E isso faz com que o trabalho ali seja mais prático e focado nas necessidades de cada um.

A experiência no CAPS Rostan trouxe um novo olhar sobre a individualidade humana e a patologização psiquiátrica. No contato diário com os usuários, ficou evidente como a sociedade, muitas vezes, reduz a complexidade das vivências humanas a diagnósticos e rótulos. A patologização psiquiátrica transforma questões sociais, existenciais e emocionais em doenças a serem medicadas, muitas vezes sem considerar o contexto de vida do indivíduo. Foi observada a importância do CAPS em acolher o sofrimento psíquico de forma integral, sendo o cuidado não restrito à prescrição medicamentosa, mas direcionado ao fortalecimento da autonomia e à promoção da cidadania dos usuários. A cidadania é trabalhada em uma atividade grupal caracterizada por expor os direitos dos usuários, seus deveres, o funcionamento do sistema único de saúde (SUS) e até o rememoramento de ilustres nomes como Nise da Silveira e Maria da Penha como figuras históricas essenciais em datas como o dia internacional da mulher.

Diferente de modelos tradicionais, que muitas vezes colocam o paciente em uma posição passiva diante do tratamento, o CAPS propõe que cada sujeito seja o protagonista de seu próprio cuidado. Promover autonomia é acreditar que a pessoa em sofrimento tem capacidade de pensar sobre sua vida, fazer escolhas e participar ativamente da construção de seu projeto terapêutico. Nos grupos, nas oficinas e nos atendimentos individuais, percebi o quanto pequenas conquistas — como decidir participar de uma atividade, sugerir uma mudança na rotina ou simplesmente expressar um desejo — representam passos importantes para a reconstrução da autoestima e do sentido de viver. Além disso, inspirados pela Reforma Psiquiátrica brasileira, os CAPS representam uma forma de cuidado que respeita a liberdade, a dignidade e a singularidade dos sujeitos, ao invés de confiná-los e silenciá-los. No CAPS Rostan, esse espírito da luta antimanicomial se materializa no cotidiano. Ao invés de isolar as pessoas em instituições fechadas, o serviço busca reintegrá-las à sociedade, fortalecendo seus vínculos familiares, comunitários e afetivos.

Compreendemos, ao vivenciar o dia a dia do CAPS Rostan, que a luta antimanicomial é muito mais do que fechar hospitais psiquiátricos: é mudar o olhar sobre o sofrimento psíquico, é criar espaços de cuidado que respeitem os direitos humanos e criar espaços sem exclusão. Em alusão à Dra. Nise da Silveira: “Tratar não é submeter o outro a nossos próprios esquemas mentais, mas ajudá-lo a se expressar.” Nesse sentido, não se trata de “curar” no sentido tradicional, mas de criar condições para que o sujeito reconecte-se com sua capacidade de criar sentidos e de narrar sua própria história. A experiência vivida foi inspiradora para nossa  formação acadêmica.