Compra-se e Vende-se Mães

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 Vamos lá, não é difícil imaginar essa situação. Cedo ou tarde o preço que pagamos por permanecermos vivos é a perda de pessoas queridas. Ora, tudo o que perdemos de alguma maneira não poderia ser substituído? Foi pensando nisso que imaginei uma empresa que comprasse e vendesse mães. A mãe é muito importante em nossas vidas. Para desespero dos pais, são sempre muito mais  lembradas, da escola ao comércio, com festas e minos.

O motivo parece óbvio. Dentro do útero iniciammos nossa caminhada nesse pedregoso mundo. Lá encontramos na maior parte do tempo conforto e proteção, a tal ponto que muitos psicólogos imaginam um "trauma do nascimento", constituído a partir do abandono dessa situação idílica e primeva.

 

De fato, mães são tão importantes que deveriam ser vendidas. Não aprendemos sobre essa possibilidade nos adágios populares? Vejam: "se conselho fosse algo bom era vendido e não dado". A conclusão é óbvia. Como as mães tendem a ser muito boas (e assim falamos mesmo quando não são) seria perfeitamente plausível que pudéssemos vender nossas mães, troca-las numa enorme "feira de mães" ou, então, comprar uma mãe novinha quando a nossa vai embora sem autorização prévia da gente. 

Tudo bem. Alguém vai argumentar que tal mercadria é muito preciosa. Então, poderíamos adquirir novas mães com empréstimos do BNDS, consõrcios (com mães por lance ou sorteio) ou, na falta de dinheiro,poderíamos alugar as mães que estivessem disponíveis. A Caixa Econômica poderia abrir canais de financiamento: "compre sua mãe em trinta anos com direito de troca caso ela perca a validade"

Vou parando por aqui, afinal, o leitor já deve ter se cansado com tamanha quantidade de sandices. Mas convido a uma reflexão. A sandice aparece como tal porque para nós mães, filhos, irmãos, amigos e,para muitos, até animais de estimação, são "elementos" irredutíveis a lógicas econômicas. A mera imaginação disso causa um desconforto psicológico. Estamos limitados por nossos valores a sentir isso. Mas valores são construtos históricos. As vezes, entre um e outro pesadelo, imagino se não estamos caminhando para um mundo onde possa ser legal el egítimo que tudo fique reduzido às relações de troca econômicas.

A recente decisão do STF que intenta "legalizar" e quiça "legitimar" a cobrança por fora no SUS caminha nessa direção. Práticas odiosas existentes hoje em alguns serviços seriam então oficializadas. Pacientes  poderiam optar por uma melhor quimioterapia no SUS. Ou então,por um cardápio com mais opções. Este é o segredo do mundo neoloberal! A liberdade de escolha! MARAVILHOSO!  Poderemos usufruir dos serviços de saúde pública da mesma forma que compramos um automóvel. Caso você não tenha o dinheiro necessário, leve pra casa o carro sem travas, sem alarme, sem direção hidráulica e sem ar condicionado. Não é significativo o fato de você ter mais chances de morrer nas ruas. Mas, se você tiver dinheiro: quuarto com ar condicionado, com doutor e enfermeira com olhar mais esmerado, remédios com menos efeitos colaterais, colchão d’água …enfim…o céu é o limite!

 

Vamos então fazer o seguinte. Que tal instituirmos a gorjeta como norma constitucional? Que tal darmos uma grana para o policial olhar melhor a nossa rua? As merendeiras das escolas públicas precisam de um dinheirinho extra para dar aquela incrementada na sopa dos filhos dos trabalhadores. Vamos aproveitar o embalo e oferecer um "agrado" para o funcionário público do INSS dar aquela apressadinha no processo de aposentadoria. Ah, não vamos esquecer da população carcerária. Os presos não poderiam pagar por melhores acomodações?

Ah, que lindo! Todo mundo se queixa da lentidão do poder judicário. Ora, se o STF entende que regular a "cobrança por fora" não fere a norma constitucional que regula o funcionamento do Sistema Único de Saúde, então, basta que também regulem o fato de cidadãos preocupados que  seus processos judiciais durem eras geológicas possam agora dar algum dinheiro para escrivãos e juízes serem, digamos, mais solícitos com os prazos e as custas! Afinal, estes também não são serviços públicos? Onde está a OAB que não percebeu ainda tamanha vilania contra a livre iniciativa?

Mas sigamos em frente. Alguém tem alguma mãe para vender?